O escopo do blog é nutrir no espaço acadêmico e intelectual uma discussão séria e científica sobre a relação umbilical entre o Direito e a Filosofia. Para tanto, devem ser assentados dois pressupostos axiais de nossa proposta: a) a perspectiva pretendida nesta página não é tout court jurídica e in re ipsa filosófica, mas interdisciplinar; b) o método utilizado diferencia-se pela capilaridade bibliográfica, isto é, pela inclinação teórica ampla e variada.


domingo, 7 de julho de 2013

Transconstitucionalismo

O TRANSCONSTITUCIONALISMO (IN)APLICÁVEL AO DIREITO PENAL COMO INSTRUMENTO DE CONTROLE DA PUNIBILIDADE: A DUALIDADE ENTRE A INTERNACIONALIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E O DIREITO INTERNO  

Leonardo Athayde Luna[1] [2]



ÁREA DO DIREITO: Constitucional; Internacional Público; Teoria do Direito.
SUMÁRIO: Introdução. I. Transconstitucionalismo – 1. Conceito – 2. Âmbito de aplicação – 3. Casos relevantes. II. O discurso constitucional contemporâneo – 1. Neoconstitucionalismo e a Constitucionalização do Direito Penal – 2. Expansão da proteção judicial dos direitos diante da internacionalização – 3. Controle de constitucionalidade e o controle da convencionalidade das leis. III. Tensão entre o direito internacional público e a soberania estatal – 1. Corrente monista nacionalista – 2. Corrente dualista. IV. Princípios e regras: uma busca (im)prescindível de critérios distintivos – 1. O polimorfo discurso na teoria jurídica - 2. Importância da distinção metodológica no cenário transconstitucional:  2.1. Regras como enunciados prescritivos; 2.2. Princípios como deveres aplicáveis prima facie
   
RESUMO
O presente estudo tem como escopo central demonstrar que não se deve mais reduzir o campo da expressão constitucionalismo ao movimento capaz de limitar o poder do Estado e tutelar os direitos fundamentais por meio da Constituição. Nos tempos hodiernos, ao mesmo tempo em que se nota uma maior inserção do Brasil no cenário internacional, também se tornou vulnerável às decisões dos Tribunais Internacionais. Reconhecendo a importância do tema e analisando casos práticos, inclusive envolvendo uma condenação fixada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, cabe à comunidade jurídica nacional e internacional passar a reconhecer a existência de um novo movimento chamado de transconstitucionalismo, uma nova forma de ver a vida e olhar para o mundo.
PALAVRAS-CHAVES: Constitucionalismo. Direitos fundamentais. Constituição. Corte Interamericana de Direitos Humanos. Transconstitucionalismo.

ABSTRACT
This study is scoped central demonstrate that one should not reduce further the field of expression constitutionalism movement capable of limiting state power and protect the fundamental rights through the Constitution. In modern times, while we note a greater insertion of Brazil in the international scene, has also become vulnerable to the decisions of international tribunals. Recognizing the importance of the topic and analyzing case studies, including a conviction involving fixed by the Inter-American Court of Human Rights, it is for the legal community through national and international recognition to the existence of a new movement called transconstitutionalism, a new way of seeing life and see the world.
KEYWORDS: Constitutionalism. Fundamental rights. Constitution. Inter-American Court of Human Rights. Tranconstitutionalism.


INTRODUÇÃO

“Car toute argumentation vise à l’adhésion des esprits et, par le fait meme,  
                                          suppose l’existence d’un contact intellectual”
Chaim Perelman e Olbrechts-Tyteca

O século XX foi marcado por vicissitudes históricas e atrocidades bélicas. Os historiadores tiveram e ainda têm muitas anedotas para divulgar sobre fatos ainda desconhecidos ou mal explicados. No entanto, não se pode negar que precisávamos passar pela devastação das bases jurídicas, pela desconsideração com o que se pode considerar como humano, pela veleidade daqueles que juridicamente estavam legitimados para a assunção quase eterna do poder.

Ao passar deste quadrante visceralmente visto como sanguinolento e sombrio, especificamente do ponto de vista fático-contextual, não é à toa que se costuma associar a ruptura de um processo de adaptação social como a Sociedade, a Cultura, e se passa a dar importância às mudanças sofridas e vividas pela própria dogmática jurídica. Os intérpretes, os juristas, os jurisconsultos ou técnicos do Direito tinham de dar uma resposta adequada aos acontecimentos até então experimentados. Não estava mais sendo possível esconder e justificar os males do nazismo e do fascismo, o que também fortaleceu a atividade jurisprudencial no sentido de revisar as suas decisões.

Agora, no alvorecer do século XXI, uma nova vereda se descortina, como um horizonte incólume, imune, infenso a qualquer tentativa de fechamento. Vive-se na melhor época, no melhor estágio de desenvolvimento e, ao mesmo tempo, de angústia, por vezes retroalimentada pela imensidão que se transformou o caldeirão gnosiológico conhecido como a Ciência do Direito.

Com isso, apenas para estreitar o alcance do que será desenvolvido nas próximas linhas, tentar-se-á dedicar alguns esforços acerca do ainda novo e pouco elaborado transconstitucionalismo aplicável ao Direito Penal, sobretudo no que diz respeito à pertinência metodológica em se trabalhar com os princípios e regras, evitando-se, não obstante – a banalizada classificação doutrinária que se consagrou na comunidade jurídica brasileira e, sim, preconizando-se o cotejo analítico-diferencial entre as normas retromencionadas, para que não fiquemos reféns do pragmatismo, do oportunismo dos tempos e da conveniência derivada do subjetivismo. 

Parte I
TRANSCONSTITUCIONALISMO

A partir do reconhecimento de que o constitucionalismo traduz uma miríade de alterações estruturais com o condão de engendrar a sociedade moderna[3], também é plausível sustentar o nítido processo de diferenciação sistêmico-funcional coexistente na sociedade que, justamente por sua fragmentação decorrente das diversas visões de mundo que, individual e sectariamente, não podem ter posição privilegiada[4], mas só a partir de um cotejo racional e multicêntrico.[5]

Após a II Guerra Mundial (1945) e a promulgação da Declaração Universal de Direitos Humanos (1948), o mundo jurídico ficou ciente das porvindouras e possíveis transformações. No campo teórico, tornou-se indisfarçável a total incompatibilidade com modelos anteriores de como um Estado de Direito poderia se manter incólume diante do seu passado infame. Tirante a confusão imanente e até candente dos Tribunais e da doutrina em se confundir a psicologia e a sociologia, com a filosofia moral e a filosofia política, deveras o positivismo foi a tentativa de se legitimar, em alguma medida, os atos emanados pelo Estado, fortificando a chamada pureza (Die Reinheit) no modo de se manejar a epistemologia jurídica, pureza esta cujo princípio metodológico fundamental é a libertação da ciência jurídica de todos os elementos que lhe sejam estranhos, mesmo quando possuam estreita conexão[6].

O fato é que o mentor do positivismo jurídico intentou criar um método puro (princípio da pureza) e objeto cognoscente com enfoque específico (norma jurídica). Deve ser alijado da ciência jurídica tudo que não pertença ao objeto de estudo do Direito, objeto este cujo pilar básico seria a racionalidade científica desvinculada dos juízos morais ou éticos[7], mas deferente a juízos de fato[8], o que serviu de sustentáculo para que os juristas fizessem mesuras ao legalismo estabelecido, inclusive rechaçando, exprobando, em regimes revolucionários[9], a norma fundamental (pressuposta), que representa o fundamento de validade de outra norma (posta)[10] e, mais ainda, de toda a ordem jurídica[11].   

Em que pese todo o esforço de se buscar criar uma ciência com atributos análogos às ciências exatas, permeada de objetividade e neutralidade interpretativa, ressalte-se que o positivismo, seja o legalista ou o normativista, foi categoricamente mitigado[12]. Veja-se o caso da tirania nazista e do fascismo italiano, movimentos políticos reprochados internacionalmente pelas agruras e atrocidades acometidas aos direitos humanos e fundamentais, ambos compondo a chamada banalidade do mal[13]. Para a superação da barbárie até então vivenciada, foi preciso de muita luta e resistência filosófica[14]. Conforme arguto pensamento de Rudolf von Jhering, o fim do Direito é a paz, e o meio para que isso ocorra é a luta[15]. Quando a superação do regime foi atingida, decaiu o positivismo kelseniano[16], abrindo espaço para que um novo modo de pensar o Direito[17] começasse a soerguer a Ética, a Justiça e a Moral, elementos permanentes para manter o dístico de todo ser humano: a dignidade[18].

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, foi difícil mesurar a colossal extensão do que tinha acontecido.[19] De qualquer forma – o significado da vitória é até hoje apreendido. Com a batalha vencida e a superação do totalitarismo e da usurpação da vida, com a aniquilação de coisas terríveis como a que ocorriam entre 1939 e 1945[20], uma nova luta passou a ser o mote de quase todos os países ditos civilizados e democráticos.

Qual seja, a defesa dos direitos humanos e fundamentais. Assim, tendo em vista que estes últimos passaram a ter um lócus privilegiado em Constituições e, em relação aos primeiros, principalmente, em documentos de matiz internacional, plausível preconizar que todas as Nações evitem desobedecê-los ou violá-los. A tese de que hoje se vive em um contexto humano policontextural e em uma sociedade multicêntrica, cujos complexos problemas não se resolvem mais avocando a soberania interna e territorialmente delimitada se convencionou chamar de transconstitucionalismo. Sendo assim, impende que se discorra a propósito de seu conceito, limites de sua incidência e algumas implicações práticas.

1. Conceito

Transconstitucionalismo, constitucionalismo de níveis múltiplos ou constitucionalismo multiplex é, em resumo – o reconhecimento de que existem problemas de matiz constitucional que ultrapassam o contorno territorial delimitador para que a soberania estatal seja exercida.[21] Não diz respeito tout court ao fato de cada ordem jurídica possuir uma Constituição.[22] De tal modo, supera-se a vetusta concepção de que controvérsias constitucionais internas estejam imunes à tendência de soluções pelo entrelaçamento da comunidade internacional, ensejando a elaboração de uma teoria da interconstitucionalidade[23]. Ressalte-se que a soberania (Carta das Nações Unidas, art. 78)[24] de cada Estado-Nação continua hospedada no invólucro principiológico do direito internacional público, não sendo despiciendo dizer que não pode ser desprezada prima facie.

Todavia, a novidade só ganhou um componente a mais, que está no modo como estão sendo travadas as relações de interpenetração entre ordenamentos díspares, vis-à-vis já terem existido pactos, como o Tratado de Westfália de 1648, em que se era perceptível a ligação entre o direito internacional clássico e o direito estatal.[25] Por via de consequência, o que passa a ser entronizado na área nuclear do debate é a integração entre as Nações, a cooperação pacífica de sistemas jurídicos e a caudal corrosão da cultura do atraso. Uma sociedade de risco e extremamente complexa não pode ficar dependente de soluções regionais. A conversação passa a ser a bola da vez.[26]

A despeito disso, como todo princípio ou regra jurídica, devem ser tratados separadamente e a partir de critérios metodológicos próprios[27], com vistas de serem evitados desatinos analíticos como, por exemplo, o oblívio e desconsideração do efeito vinculante (Bindungswirkung) de tratados internacionais de direitos humanos que, como acentua sólida doutrina, na sistemática brasileira, quando aprovados, passam a desfrutar de aplicabilidade direta e imediata, incorporando-se ao bloco das normas equivalentes às emendas constitucionais, mesmo que não tenham passado pelo rito procedimental estampado no art. 5º, §3º da CF/1988.[28]

Bastaria, nesta esteira, que a jurisprudência e a própria doutrina fizessem uma absorção da quintessência do que apontado no art. 5º, §2º da Constituição brasileira de 1988[29], ao dizer que: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.[30]

A lógica do raciocínio esposado na defesa da tese é fundamentada de forma seminal pelo internacionalista Valerio Mazzuoli: “se a Constituição estabelece que os direitos e garantias nela elencados ‘não excluem’ outros provenientes dos tratados internacionais ‘em que a República Federativa do Brasil seja parte’, é porque ela própria está a autorizar que esses direitos e garantias internacionais constantes dos tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil ‘se incluem’ no nosso ordenamento jurídico interno, passando a ser considerados como se escrito na Constituição estivessem. É dizer, se os direitos e garantias expressos no texto constitucional ‘não excluem’ outros provenientes dos tratados internacionais em que o Brasil seja parte, é porque, pela lógica, na medida em que tais instrumentos passam a assegurar outros direitos e garantias, a Constituição ‘os inclui’ no seu catálogo de direitos protegidos, ampliando o seu ‘bloco de constitucionalidade’”.

Com espeque nos escólios doutrinários de sólida cientificidade e na verificação abundante do novo rumo dos tempos hodiernos, que exige um vigoroso e efetivo diálogo de fontes[31] e abertura sistêmica, particularmente de ordens jurídicas, só nos resta vivenciar a galvanização, a subsistência fática e o recrudescimento do controle de convencionalidade das leis, como enfatizou a própria Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Almonacid Arellano e outros vs. Chile, ao declarar em sentença, in verbis: “Quando um Estado ratifica um tratado internacional como a Convenção Americana, seus juízes, como parte do aparato do Estado, também estão submetidos a ela, o que lhes obriga a zelar para que os efeitos dos dispositivos da Convenção não se vejam mitigados pela aplicação de leis contrárias a seu objeto (...) o Poder Judiciário deve exercer uma espécie de ‘controle de convencionalidade das leis’ entre as normas internas que aplicam nos casos concretos e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Nesta tarefa, o Poder Judiciário deve ter em conta não somente o tratado, mas também a interpretação que do mesmo tem feito a Corte Interamericana, intérprete última da Convenção Americana”.[32] 

Esclareça-se, por oportuno, que se vive em um vertiginoso processo de transformação ou transmudação dos dogmas antigos do direito internacional público. Se a ótica vetusta era a de se ter em mira o papel inconcusso do princípio do domestic affair (ou da não intromissão, não intercessão), cuja função era limitar o direito das gentes às relações entre Estados em um contexto de uma sociedade internacional formal, hoje e não muito antigamente, por influência e a partir da inserção dos países no sistema interamericano de direitos humanos e, singularmente, do Brasil, mudou-se o ângulo do castrado discurso internacional para a criação e manutenção do alvissareiro princípio do international concern, que, em linhas mestras e gerais, consubstancia a preocupação internacional em dar vazão e efetividade aos direitos e liberdades fundamentais de todos os Estados partícipes de um sistema mínimo de proteção internacional dos direitos humanos.[33]

No caso do princípio da soberania nacional, mesmo resguardando o seu caráter monolítico de internamente fazer com que os Estados garantam aos indivíduos sob o jugo de sua jurisdição o gozo de um plexo catalogado de direitos esculpidos em tratados, a soberania cifra-se, por sua vez, ao dever estatal de aceitar a fiscalização de órgãos internacionais com competência para verificar se há ou não conformidade de sua atuação com os atos internacionais dos quais seja signatário.[34]    

Se o constitucionalismo é considerado o movimento pelo qual se consagrou a limitação do poder estatal, a tutela dos direitos fundamentais e a ideia de supremacia da Constituição em face da força da Lei (Gesetzeskraft) ou da supremacia do Parlamento, o transconstitucionalismo aparece como uma vereda dialógica entre o direito internacional e o direito constitucional interno. Se a Lei Fundamental de um país com tradição romano-germânica se impõe como o fundamento de validade de uma ordem normativa (Der Geltunsgrund einer normativen Ordnung)[35], isto é – daquela ordem social territorialmente erguida, com poder originário de mando e povo, a essência do direito internacional é, como se pressupõe, direito no idêntico sentido que o direito estadual (Recht in demselben Sinne ist wie das staatliche Recht).[36]

A distinção só exsurge quando se busca dar prevalência a um e a outro, tornando a tarefa de todo intérprete um tanto quanto árdua. Não obstante, inconteste o fato de que todo o pensamento jurídico não pode ser arbitrado somente pelo pragmatismo, por aquilo que aparenta servir ao conclamo da praxe, mas que busque esteio no labor científico e na coerência argumentativa, desnudando expressões herméticas, descobrindo as raízes históricas dos institutos, sem olvidar da ilustre missão de atribuir rigidez e precisão aos conceitos até então investigados. Eis o papel da doutrina.[37] Nos dizeres de Rudolf von Jhering: “Die wissenschaft darf um, wahrhaft praktisch zu sein, sich nicht auf das Praktische beschränken.”[38]

2. Âmbito de aplicação e limites


Entender a pertinência de como deve ocorrer a aplicação de algo e a incidência de suas balizas é algo inexoravelmente curial. Independentemente da matéria que se cuide, não basta procurar esmiuçar as sutilezas terminológicas, os seus mínimos detalhes e identificar ramificações compatíveis com os fatos cambiantes, estes traduzidos em sensações, sentidos, consequências. Não é preciso ir muito longe para superar o paradigma kantiano de que é impossível deduzir valores da realidade, e de que entre o julgamento dos fatos e os valores há uma barreira inexpugnável. Para aqueles que adormecem sob o efeito mais hermético do sonífero kantiano, talvez seja preciso parar por aqui, em virtude de ipso facto caminharem sendo sustentados por uma das pernas. O efeito de tamanho descuido só pode ser a queda fatal rumo ao abismo.

Todavia, quem conseguiu identificar o sofístico raciocínio lastreado no quase ultramontano estamento filosófico, saberá que a percepção sensível, por mais primária e aparentemente acessória, pode alterar a compreensão de dado objeto, corpóreo ou não. Sendo assim, a intelecção sensorial de um objeto dependerá da própria realidade em que o sujeito cognoscente estiver incluído. Sem parcas dúvidas, caso duas pessoas se dispusessem a vasculhar os meandros de um dado qualquer da realidade, invariavelmente umas delas poderá estar com um afastamento do eixo teórico e do eixo empírico bastante relevante, o que fornece esteio para o que se chama de paralaxe cognitiva.

Com o objetivo de afastar maiores excursões, o fato é que buscar estabelecer limites a algo e traçar a epistemologia de sua aplicação constitui o consectário intuitivo de todo aquele que se debruça por um problema real ou circunstância fundamental. Afinal, o transconstitucionalismo não é em si mesmo um problema, mas um fato. Uma contingência dos tempos modernos, assim como a judicialização da vida e a interconexão bastante eloquente com o chamado ativismo dos juízes.

Ao se fazer um paralelo sutil entre o ativismo judicial e o transconstitucionalismo, entrevê-se, ao menos in thesi, um novo instrumento para o controle das decisões judiciais, já que os limites jurídicos não estariam mais nas leis internas e na própria Constituição. Aliás, independentemente do sistema jurídico adotado por um país e das suas singelezas estruturais, estribadas muitas vezes em idiossincrasias incoerentes e por filigranas históricas avassaladoras, não se pode alterar o fato de que a soberania esfacelou-se. Com isso, o dogma da supremacia judicial e da prevalência da Lei Maior parecem não mais cultivar de absoluta indenidade. Neste caminhar, se o ativismo e a judicialização são sobejamente escrutinados e estudados em alguns países, talvez em um plano menos articulado e homogêneo[39], mais atenção ainda mereceria a fenomênica transconstitucionalidade.

A dogmática jurídica brasileira e mundial infelizmente não se deu conta de que preconizar a existência de limites e a circunscrição do âmbito de aplicação do transconstitucionalismo é para justamente evitar o acirrado debate entre o direito internacional público e a autonomia interna decorrente da ordem jurídica de cada país. O escopo principal é rechaçar a cólera do viés puramente ideológico de cada sistema político, e calcar a discussão em critérios objetivos, tais como a dualidade funcional transconstitucional, qual seja: i) a pretensão homogeneizadora; e ii) a pretensão normativa reparadora.

O primeiro elemento de aplicação do transconstitucionalismo é a verificação de estruturas normativas compatíveis ou entrelaçadas. Ou seja, a pretensão de caráter homogêneo enseja a busca por sistemas jurídicos que acolham decisões que sufraguem o novo modelo de constitucionalismo, modelo este que entende que deva haver uma relação salutar entre ordens jurídicas e, mais ainda, uma relativização da soberania (armadura jurídica) para que se reestabeleça o ideal da deusa Thêmis. Afinal, até as Cortes de Justiça de cada Nação podem ficar sujeitas à falibilidade, não raras vezes incentivada por injunções políticas, econômicas e dos temidos grupos de pressão. Este não é o mundo dos sonhos, mas também não pode ser o inferno dantesco. 

O segundo elemento de aplicação é de caráter normativo. Como se tentou demonstrar, sem uma relativa simetria das formas de direito não há espaço para o transconstitucionalismo.[40] Neste diapasão, a pretensão normativa também tem um viés reparador, quer dizer, de restituir ou tentar compensar um grave dano a um direito fundamental estatuído em um documento de colorido internacional ou que invoque um ideário de proteção aos direitos humanos. Assim, não poderia o Supremo Tribunal Federal brasileiro ou a Corte Suprema de Justiça argentina desconsiderar o fato de que mesmo uma decisão emanada por estas Cortes não poderia deixar de passar pelo crivo judicial da Corte Interamericana de Direitos Humanos ou pelas recomendações da Comissão Americana de Direitos Humanos. Afinal, o trânsito em julgado de uma decisão, especialmente no último grau de jurisdição, não pode significar a melhor solução.

Já dizia o Nelson Hungria: “O Supremo Tribunal Federal tem apenas o privilégio de errar por último”. Com isso, quer-se salientar que seria sable aux yeux (colocar areia nos olhos) ou incutir um cisco no olho referendar categoricamente que não há possibilidade de uma decisão incorreta, injusta ou contrária aos direitos fundamentais e aos direitos humanos, mesmo quando advier do guardião da Constituição, com uma competência tão fluídica e embaraçada como a do Supremo Tribunal Federal brasileiro.[41]

Ainda vigora timidez institucional e inapetência quanto ao acolhimento das novas tendências cotidianamente verificadas no campo internacional, porém já é possível auscultar um conjunto de casos assaz paradigmáticos, que começam a romper relações com o atroz anacronismo.

                       
3. Casos relevantes

Não é difícil encontrar, sobretudo no panorama internacional, decisões proferidas por Cortes de Justiça ou órgãos colegiados dispostos para dissolver controvérsias que superam o além-mar de cada país. Indiscutível que ainda não se sistematizou precisamente o impacto das referidas decisões e qual é o grau de vinculatividade[42], fazendo com que países e as próprias instituições (Legislativo, Executivo e o Judiciário) cumpram as determinações promanadas. Com o arriscado intento de satisfazer minimamente a curiosidade dos mais preocupados através de uma visão en passant, serão analisados dois casos selecionados por sua relevância e peculiaridades, porquanto suas conclusões serem ainda inconsistentes, subjaz um apelo implícito por uma crítica e sistematização.

O primeiro caso a ser decodificado é o da “Guerrilha do Araguaia”, em que a Corte Interamericana de Direitos Humanos não teve dúvida em condenar o Brasil pelos atos desumanos, mortíferos e deletérios durante o período da ditadura militar (1964-1985), especificamente por ter sido omisso ao não diligenciar e averiguar o desaparecimento de várias pessoas. A condenação teve como mote a verdade e a memória, ambos pedaços indissociáveis para a formação e historicidade da existência humana.[43] A CIDH realizou um controle de convencionalidade da legislação interna brasileira e concluiu que a Lei da Anistia é incompatível com a Convenção Americana de Direitos Humanos.

De tal sorte, reputa-se incoerente e contraditória a decisão do Supremo Tribunal Federal no bojo da ADPF n. 153, haja vista ter julgado improcedente a ação e ter interpretado como constitucional a Lei n. 6.683/79, que conferia anistia aos agentes estatais responsáveis por graves violações aos direitos humanos durante o regime de exceção brasileiro, assomando, também, a extensão aos crimes comuns praticados pelos agentes da repressão contra opositores políticos durante o período de paralisação do relógio democrático.

Ad argumentandum tantum, urge uma reflexão teórica e prática, culminando com uma pergunta desafiadora. A Constituição do Brasil estabeleceu a possibilidade de o depositário infiel ser preso (art. 5º, LXVII). Mesmo assim, o Excelso Supremo Tribunal Federal acatou e respeitou o art. 7º da Convenção Americana de Direitos Humanos, que rechaça terminantemente a possibilidade depositário, independentemente do depósito, ser levado ao cárcere. Para tanto, editou a Súmula Vinculante n. 25, que diz: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. 

Ora, se os direitos fundamentais não estão tipificados de forma exauriente e na própria Constituição Federal de 1988 há uma cláusula de abertura material[44] entalhada no art. 5º, §2º, não há motivo para tanto receio de preservar a própria soberania estatal. Antes de se fazer uma tacanha interpretação conforme à Constituição (Verfassungskonforme Auslegung), impõe-se uma interpretação conforme os direitos fundamentais (Grundrechtskonforme Auslegung).[45] Se o poder constituinte originário tomou a decisão de interiorizar uma norma de fattispecie ampla, sem pronunciamentos estanques e um prejugé (viés, direção, tendência) pluridimensional, as razões descambam para o singelo alumbramento. Tamanha façanha é digna de encômios.

O segundo exemplum in contrarium à regra geral de que basta aplicar o princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional (CF/88, art. 5º, XXXV), ao dispor que nenhuma lesão ou ameaça de lesão ficará imune da proteção judicial, restou conhecido como “Caso Ximenes Lopes versus Brasil”. No introito de outubro de 1999, Damião Ximenes Lopes fora acometido por uma crise, levando-o à quase compulsória internação hospitalar. Após ter ingressado nas dependências da Casa de Repouso de Guararapes, única e pequena clínica psiquiátrica localizada no Município de Sobral, Estado do Ceará, fora acometido por um surto de cólera, o que fez com que os funcionários da clínica utilizassem da força bruta para constrangê-lo e imobilizá-lo.

A sua mãe não hesitou em visitá-lo, encontrando-o em um estado deplorável, coberto de fezes, sangue e hematomas pelo corpo. À cata de uma solução, saiu em busca de ajuda dos médicos e enfermeiros da referida clínica. Naquele mesmo fatídico e horripilante evento, Damião Ximenes Lopes faleceu. Posteriormente ao horrendo desfecho do fato narrado, incumbiu à família da vítima encabeçar uma notitia criminis perante a autoridade policial, uma denúncia ante a Secretaria de Saúde e na Comissão de Direitos Humanos do Ceará. O inquérito policial foi instaurado e tão somente sido incoada a peça acusatória, pelo Parquet, em 27 de março de 2000.

Tendo em vista o profundo estado inercial da justiça brasileira, a irmã da vítima apresentou uma petição na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos contra o Brasil, tendo como co-peticionária a organização não governamental Centro por la Justicia Global. Tendo a Comissão entendido que tinham sido violados os arts. 4º (direito à vida), 5º (direito à integridade física), 8º (direito às garantias judiciais) e 25 (direito à proteção judicial) do Pacto de San José da Costa Rica, recomendou que o Brasil tomasse providências.

Constatadas as inequívocas violações aos direitos humanos e o não atendimento das recomendações, preferiu a Comissão submeter o caso à CIDH. No dia 04 de julho de 2006, o Brasil foi condenado por violação do direito à vida, integridade física e sonegação de jurisdição pela injustificada demora na prestação da tutela penal e cível.[46]

Em que pese todos os argumentos despendidos e a fundamentação principiológica extraída pela leitura do Direito Constitucional e do próprio Direito Internacional Público, no primeiro caso retrocitado, sabe-se torrencialmente que o Brasil não encampou a tese prevista no art. 62 da CIDH, isto é, a de aceitar de forma expressa a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos como pretório competente para julgar casos de vilipêndio a direitos humanos ocorridos no País. Isso só passou a ocorrer em 1992[47].

Com isso, conclui-se que o Brasil não está, em tese, compelido a sujeitar-se a um processo instaurado na CIDH sobre fatos ocorridos antes do reconhecimento da sua jurisdição. Não é essa, todavia, a leitura mais consentânea do princípio do acesso à justiça internacional e da dignidade da pessoa humana, esta cujo caráter fluídico e plástico[48] permite ao intérprete e aos Tribunais de Justiça, especialmente os de jurisdição supranacional, uma margem de manobra (Spielraum).[49]

Destarte, o transconstitucionalismo pode servir tanto para coibir práticas violadoras dos direitos humanos, penalizando, por intermédio de uma decisão condenatória, por exemplo, condenando o próprio Estado ao pagamento de uma indenização, por ter operado no sentido de violar direitos humanos, garantias processuais penais, vergastar os princípios do direito processual penal (die Grundsätze des Strafverfahrensrecht) e de índole criminal, o que repercute seriamente no direito fundamental à liberdade do cidadão e no princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade (Unschuldsvermutung)[50], além do princípio que veda um processo com dilações indevidas.

Nesta esteira, não basta uma decisão judicial ou acórdão de um Tribunal considerar as leis de regência e a Constituição reinante, mas que a era da internacionalização dos direitos humanos e do universalismo tornaram-se uma realidade constante. A superação do establishment ainda é gradativa, mas os passos estão sendo dados.

Entretanto, não cabe ao tranconstitucionalismo controlar a punibilidade ou incutir parâmetros decisórios à judicatura brasileira, principalmente na seara da dosificação apenatória, isto é – no campo da dosimetria da pena aplicada àquele que delinquiu. Permitir tamanha abertura seria erodir toda uma tradição legislativa, histórica e até mesmo dos precedentes. O que pode ocorrer é uma “revisão” das sentenças proferidas, só que tal releitura ficaria sobremodo limitada ao terreno da indenização cível, não se imiscuindo no campo do trânsito em julgado e, por sua vez, na execução da decisão judicial.

Como os critérios de julgamento e de aferição probatória dependem do ambiente em que o aparato do Poder Judiciário se encontra e até mesmo do problema da morosidade e da crise numérica referente à quantidade de processos, seria questionável a recomendação no sentido de haver uma permanente prevalência da sentença emanada da Corte Interamericana de Direitos Humanos e não a prolatada pelo Supremo Tribunal Federal, verbi gratia. O que pode ser auscultado ou perquirido é qual das respostas, mesmo se céleres ou serôdias, é a mais favorável ao indivíduo atingido no seu âmago.[51] Em apertada síntese, não se pode determinar aprioristicamente o que deve prevalecer, se a sentença da CIDH ou aquela advinda da Justiça brasileira. O que se deve buscar é aplicar o postulado do princípio pro homine casuisticamente.[52]

Parte II
O DISCURSO CONSTITUCIONAL CONTEMPORÂNEO

A Teoria do Direito é uma disciplina que sempre trabalhou com a ideia de que a sociedade precisa de regras de conduta para disciplinar a mercancia, os negócios, as relações primitivas, a vida como um todo. Há uma abundante maneira de identificar-se uma significativa constatação: os elementos ser (ôntico) e o dever-ser (deôntico) sofreram profundas transformações. Por sua vez, o know-how do jurista seguiu a caminhada da alternância, da mudança. A singular natureza do presente, portanto, é asseverar que as Ciências Jurídicas se espraiam a depender de cada momento histórico e também da mentalidade jurídica, da apreensão que as pessoas têm ou tiveram de sua existência e aplicação.

Não se está afirmando que o Direito deve ficar dependente das circunstâncias do presente, das variações de humor, da ciclotimia da Política, do interesse das maiorias. O pressuposto a ser cimentado aqui é outro, qual seja, o de que cabe ao jurista implementar uma metodologia nova de se manusear os textos legais, não a partir unicamente da Lei, mas da Constituição. Esta não é mais um pedaço de papel (ein Stück Papier)[53], mas o epicentro axiológico da cultura jurídica dos povos.
O fato é que o Direito do século XX não conseguiu dar respostas condizentes com a complexidade da sociedade, além de terem sido insuficientes as explicações sobre o mal que remanescia das duas Grandes Guerras. Ou seja, juridicamente era insustentável forcejar os horrores praticados por líderes carismáticos ou ensandecidos como Hitler e Mussolini, por exemplo.

Por conseqüência, a doutrina passou a se preocupar com o invólucro ético e moral dos fatos juridicizados pelo Estado, leia-se: a partir da incidência da regra jurídica[54]. Desde Montesquieu isso ficou mais do que claro. Os Poderes são seccionados para que a distribuição das atividades seja mais efetiva e não haja anorexia de sua legitimidade.

Dessa forma, cada membro tem sua competência constitucional para legislar, aplicar a lei e executar a sua determinação. Especialmente em uma res publica que vigora o sistema romano-germânico, legalista ou legalitário, calcado na positivação legal em um texto encartado e circunscrito através de um procedimento. A diferença básica é que no Brasil, seguindo à risca o sistema adotado, há a prevalência das leis sobre as decisões judiciais, diferentemente do que ocorre na América do Norte e em grande parte da Europa Continental. Com isso, o juiz declarar ou dizer algo processualmente não é dizer o Direito, mas é dizer o que seja de direito (conforme a lei).

Mas há mais a considerar.

Mesmo após atravessarmos uma série de paradigmas e modelos que concorreram para a construção do que chamamos de Estado Democrático de Direito, temos de nos preocupar com o que chamamos “as correntes de Ulisses”. Certamente é inesquecível a poética passagem do Canto XII da Odisséia, em que Homero narra a volta de Ulisses ao reino de Ítaca após o massacre de Tróia. Não obstante, a narrativa se centra em uma situação tortuosa e tormentosa. O ilustre navegante teria de superar a tentação do ressoar melódico das sereias, evitando, pois, o inexorável naufrágio da sua embarcação. Para evitar tal lástima, ordenou que cada um dos seus subordinados tapasse os ouvidos com cera. Além disso, determinou que seus grumetes o atassem, amarrassem-no a um mastro, justamente para que se privasse do risco, mas não do prazer de ouvir o lirismo musical. 

O contexto que se coloca é que em um Estado de Direito há limites e razões mínimas que possuem guarida no novo paradigma em que nos encontramos. Hoje há um modelo superado do chamado positivismo, que dá margem ao tão enaltecido pós-positivismo, quiçá nominado de novo constitucionalismo. Significa dizer que, atualmente, a Constituição passa a ser o centro do sistema jurídico, e que não basta averiguar se há o respeito ao conteúdo formal ou material de uma regra infraconstitucional[55]. Pelo contrário. É dever daqueles que militam frente ao discurso jurídico da cotidianidade respeitar a norma normarum de seu país. Eis o nosso limite como lidadores jurídicos e preservadores da integridade do Direito[56].

Vive-se em uma democracia constitucional que nos impõe um circulatório normativo insuscetível de disposição de quem quer que seja. Todos se submetem à potestade derivada da Lei das Leis. Daí se conclui que é dever dos juízes, promotores, advogados, promoverem o chamado discurso da fundamentação (Begrundungsdiskurs). Leia-se, dever-poder e não poder-dever. O resultado dessa cautela será a proteção do postulado da experiência jurídica da Nação, uma garantia essencial para o desenvolvimento contínuo do homem. Se este é o escopo (goal), é porque agora o pensamento jurídico passou a estar comprometido com uma teoria do homem.[57] É preciso de amor, de sacrifício, para que toda obra se edifique com bases sólidas e bem sedimentadas.[58]

Vê-se, logo, ante o novo horizonte descerrado e da cortina que se abriu que, considerando-se os aspectos históricos e a contemporaneidade dos acontecimentos, não se pode deixar de entrever a necessidade de se trabalhar com um discurso constitucional diferenciado. As categorias interpretativas, os métodos, os princípios, o instrumental normativo, o aparato legislativo, a estrutura institucional, a teleologia mandamental e o arsenal teórico mudaram ou, mesmo não tendo sido objeto de profunda alteração, passaram, sim, por um processo de enrijecimento decorrente da tecnologia jurídica da atualidade.

A geração e, particularmente, a cultura jurídica brasileira certamente não ficou imunizada, mesmo após a consolidação das instituições e o estabelecimento sólido e consistente das teses jurídicas tecidas. Ao contrário, es lebe die anschauungen (viva as intuições), haja vista ter sido possível prever o que hoje se desfruta. Afinal, testemunha-se a inoculação de um vírus disforme, sem paralelos, que grassou no DNA do Direito, propiciando o que setor da comunidade jurídica critica e repugna, mas não se pode negar, a mixagem teórica, o protagonismo judicial[59], o polimorfismo doutrinário, o sincretismo metodológico[60] ou, o que aqui se defende, o estrabismo interpretativo[61]

Portanto, para que se acompanhe serenamente o tema ventilado até então, deve-se palmilhar pela vertente multidisciplinar, como um verdadeiro caleidoscópio, desnudando os escaninhos do hermetismo e da sisudez recôndita da ortodoxia procedimental. O propósito é evitar que a obtusidade das formas de se olhar o status quo não suplante, não sepulte ou não esconda a paralaxe interpretativa[62], mas enalteça os movimentos recentes e aqueles não tão bem explicados, o que só fornece fórceps para a edificação de um futuro mais bem compreendido ou quiçá de um happy end.

1. Neoconstitucionalismo e a constitucionalização do direito penal

Costuma-se associar à expressão neoconstitucionalismo[63] uma série de transformações vividas e sofridas na ciência do direito, que podem ser identificáveis em maior extensão[64] e, de maneira muito particular, no Brasil. Na literatura autorizada encontram-se outras terminologias, tais como neopositivismo[65], positivismo reconstruído, positivismo ético[66], positivismo includente[67] ou até referências no sentido da existência de neoconstitucionalismos.[68] Sem falar, é claro, da interconexão percebida por alguns do que se apelidou de ativismo judicial[69].

Afinal, se o constitucionalismo surgiu com o objetivo de (de)limitar o Poder do Estado[70], não é por acaso que se agregue à nomenclatura reformulada, somadas às suas novas características e à própria judicialização[71], à nova atitude empreendida pelos juízes.[72] Nem tudo mudou, mas nada do que restou permanece o mesmo.[73] Destacar-se-ão, todavia, quatro das transformações[74] supracitadas, a título exemplificativo e em respeito à síntese que os limites textuais exigem. 

A primeira é a superação da ideia de que a lei é a fonte principal do sistema jurídico (aspecto endonormativo), já que com o esvaziamento do positivismo exegético (ou sintático) e o positivismo kelseniano ou semântico, passou a vigorar a máxima de que a Constituição é a ordem jurídica fundamental de toda a coletividade.[75] Se o poder soberano se assenta no povo, não é por somenos razão que a democracia política necessita também ser enraizada pelos escaninhos republicanos, estes que possuem hospedagem especificada na Lei Fundamental. Desta forma, reconhece-se, por consectário lógico-dedutivo, a força normativa da Constituição[76] (Die normative Kraft der Verfassung), o que induz todos os intérpretes e os operadores do Direito a uma nova forma de manejar as engrenagens do processo social de adaptação cogente: der Recht.

A segunda é o reconhecimento de juridicidade dos chamados princípios, independentemente deles estarem calcados em um suporte textual (texto legal) ou serem perceptíveis de forma implícita através de várias modalidades interpretativas[77]. Agora, tanto as regras quanto os princípios possuem a mesma estatura de norma jurídica, diferençando-se, entretanto – a partir do critério estrutural[78] e da aplicação, e não da generalidade e da especialidade. Isto significa que a diferença entre regras e princípios é qualitativa e não de grau ou de natureza quantitativa.[79] Com isso, passa-se a valorizar métodos de decisão como a chamada ponderação[80] ou balanceamento (Abwägung) que, junto com o princípio ou a máxima da proporcionalidade  (Verhältnismäßigkeitsgrundsatz)[81] acabam por ter o condão de instrumentalizar os princípios, enquanto a subsunção possui uma mola-propulsora para a aplicação das regras.

A terceira é sintetizada na constitucionalização da vida privada[82] e das relações sociais (aspecto exonormativo), o que é reforçado pela irradiação dos efeitos imanentes à realização dos chamados direitos fundamentais, seja no campo público ou privado. Quer isso dizer não apenas a introdução de uma pletora de regras e princípios de caráter penal, tributário, cível, trabalhista, agrário, previdenciário e outros na Lei Maior. Mas que toda a gnosiologia constitucional, leia-se, as matérias disciplinadas pela Constituição, passará(ão) a ter sobeja  relevância, impelindo o intérprete e todo o cultor do Direito a uma atitude prudente, qual seja, a de observar o ordenamento com a lente constitucional, para que promova uma verdadeira profilaxia normativa quando da aplicação e implementação das normas jurídicas.

A quarta é a chamada jurisprudencialização ou precedentalização[83] do sistema romano-germânico, também alcunhado como civil law, isto é – a importância que passou a ter os precedentes judiciais e a atividade pretoriana, notadamente à cata de definição de questões controvertidas na seara doutrinária e política. Afinal de contas, como é cediço, o sistema legalista ou legalitário é pautado pela positivação da lei em uma cártula (documento). Porém, como restou demonstrado, a ideia de que, em princípio, o texto escrito é a primeira e a mais importante expressão do direito passou a ser um pedaço da verdade. Agora, a legalidade ganha contornos de justiciabilidade.[84]

Com isso, vê-se a hipertrofia da interpretação judicial e a sua elástica pretensão modernizadora do direito vigente, seja fixando novos entendimentos ou empreendendo soluções para cases ainda não antevistos.  Ao menos no que se refere à análise jurídica dos termos, se tudo é linguagem, e esta é a pauta adotada neste texto, deve-se ater à linguagem jurídica, associando, obviamente, a perspectiva interdisciplinar que os problemas requerem. Em poder de sinopse, soluções complexas servem para problemas complexos. Casos simples dependem de soluções simplórias. Todavia, situações problematizadas pela complexidade, se forem resolvidas através da simplificação serão futuras vítimas da erronia.

2. Expansão da proteção judicial dos direitos diante da internacionalização


Hoje há uma pretensão à sentença (Urteilsanspruch) como talvez não se desejasse outrora. Todavia, esta pretensão ou vontade passou por nevrálgica mudança, consistente no fato de que o papel da jurisdição restou ampliado. Sendo assim, não pode a atividade jurisdicional ser reduzida à produção de uma mera decisão quantitativa[85] de uma autoridade judicial e, até mesmo, capaz de dissolver um litígio. Não. No Estado Constitucional Democrático contemporâneo de Direito deve-se adotar a premissa de que hoje há uma sólida teoria dos direitos fundamentais, dos princípios constitucionais e acerca do controle de constitucionalidade.

Certamente, a máxima de que a jurisdição é inerte precisa ser revista, haja vista o seu métier exigir cada vez mais uma pró(du)-(a)tividade[86]. Cabe agora ao juízo monocrático e às Cortes de Justiça ou órgãos colegiados a obrigação de fazer valer as leis, a Constituição e os valores insculpidos em tratados internacionais, especialmente aqueles que tratarem de direitos humanos. De tal maneira, axiomas como a soberania estatal ou o princípio da independência nacional podem ficar sujeitos a uma certa relativização ou mitigação, em virtude da escancarada internacionalização.

Parte III
TENSÃO ENTRE O DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E A SOBERANIA ESTATAL

Se há na vida terrena espaço para cisão, divisão, desacordo moral razoável ou posições distintas entre pessoas esclarecidas que, infelizmente, não são encaradas como complementares, mas indissociáveis. Talvez fosse digna de consideração a tentativa de se perscrutar as razões defensórias de pretensões com matizes inegavelmente opostos. Como para toda tese há sempre uma antítese, no Direito isso fica ainda mais evidente. A única obrigação da doutrina, especialmente pela dimensão analítica[87], é elucidar conceitos, sedimentar métodos consistentes e condizentes com a razão e segurança jurídicas. É neste contexto que se evidencia uma (im)possível tensão, dentro do campo temático delimitado pelo texto – entre (i) a corrente monista nacionalista e (ii) a corrente mista ou dualista.

1. Corrente monista nacionalista

A corrente monista nacionalista, apodada de monismo com primazia do direito interno ou de teoria do “culto à Constituição”, busca defender a prevalência da produção normativa emanada pelo Estado. Este, visto como entidade integrada por um povo, território e poder originário de mando, além de ter erigido um documento político-jurídico-social chamado Constituição.

De tal forma, nota-se que o que se intenta preservar é o status quo jurídico de uma Nação e colocá-lo sob uma posição privilegiada em relação ao direito internacional público. Com isso, em tese, havendo um conflito entre normas jurídicas de um determinado país e princípios ou regras de um tratado ou convenção internacional, dever-se-á ponderar em favor do direito nacional.

2. Corrente dualista

O dualismo talvez seja a corrente intermediária entre o radicalismo ou purismo científico ou a uma tendência narcisista em se observar os problemas embutidos no cenário (trans)constitucional. Aquele é composto pelo binômio de que (a) o direito internacional público deve transformar-se em direito interno e (b) de que não haveria conflito de normas, pois ambos representam sistemas interdependentes, inter-relacionados.

A partir dessa premissa, não haveria nenhuma antinomia ou tensão, mas concessões recíprocas a partir de uma análise casuística. Destarte, a ordem jurídica interna e a externa (internacional) atuariam em planos separados, porém paralelos. Diz-se também que este é o modelo do dualismo paralelo. A tese é a de que há diferença das fontesdiferença dos sujeitos e diferença dos mecanismos garantísticos.[88] Esta é a corrente adotada no Brasil, embora haja uma aguda divergência.[89]

A consequência prática, no campo do direito dos tratados, é a de que para um tratado ratificado produza seus efeitos no ordenamento jurídico interno, constitui como imperiosa a edição de um ato normativo nacional – em terras brasileiras, conhecido como decreto de execução, exarado pelo Chefe do Poder Executivo, com vistas a conferir execução e cumprimento ao tratado ratificado no âmbito interno. Este é o pensamento majoritário da doutrina vigente. Embora seja esse o quadro atual, cumpre-se defender tese oposta, a de que a interpretação deve ser a de que para os tratados de direitos humanos, assim que ratificados, devem irradiar imediatamente seus efeitos na ordem jurídica internacional e interna, tornando-se despicienda a edição de um decreto de execução.[90]    

Parte IV
PRINCÍPIOS E REGRAS: UMA BUSCA (IM)PRESCINDÍVEL DE CRITÉRIOS DISTINTIVOS

1. O polimorfo discurso na teoria jurídica

A dogmática jurídica não é a mesma de outrora. Se a ciência é uma ramificação gnosiológica imbuída de raízes rígidas, fixas ou anatomicamente consistentes, com o Direito não poderia ser diferente. Todavia, nota-se no oxigênio intelectual uma fluidez, incerteza e histeria de conceitos e perda de certos parâmetros. 

O ambiente atual é o da celeridade, presteza e velocidade nas soluções. O pragmatismo começa a medrar como um vírus inoculado em um organismo depredado imunologicamente. Assim, vê-se discursos apopléticos e desesperados a favor dos festejados princípios jurídicos. A letra da lei já não desfruta do mesmo valor que antigamente, o que fez com que os textos jurídicos fossem lidos não como repertórios apartados da realidade, mas conectados com a famosa tríade realeana: fato, valor e norma. 

Com isso, rompeu-se drasticamente com o paradigma bizantino da exegese bas fond de interpretar o texto legal simplesmente apreendendo o significado dos termos inscritos em um Código, sem nenhuma  relação com os fatos, os valores e as normas em sentido amplo. Ao mesmo tempo, foi assim que uma série de juristas começaram a misturar conceitos e, não raras vezes, confundir o conceito de um instituto ou termo com a sua aplicação.

O polimorfismo discursivo e temático virou objeto da constância dos tempos e passou a constituir o pecado capital da teoria jurídica, que não conseguiu encontrar uma segurança metodologicamente infusa, mormente na elaboração de critérios distintivos para as regras e os princípios jurídicos. Utilizando uma figura de linguagem, a garrafa que era de vidro despedaçou-se, cabendo agora a criação de um material novo e resistente.[91]

A situação piora quando qualquer estudioso intenta pesquisar na literatura o que já foi dito e escrito sobre o assunto. Infelizmente, grande parte se assusta pela imensidão da produção doutrinária, desistindo sem pestanejar. Para não transformarmos este texto em opúsculo retórico, adentremos no campo da distinção entre princípios e regras, sem olvidar, é claro, de pincelar uma situação prática. Costuma-se acentuar que as regras são enunciados descritivos de condutas embebidos de definitividade[92] e os princípios são mandamentos de optimização que são aplicáveis prima facie, consideradas as possibilidades fáticas e jurídicas.[93] 

Como a interpretação exige a intermediação da linguagem para que prospecção de um sentido se realize efetivamente, só a partir da intelecção do autor com o objeto cognoscente é que se pode falar em normas ou possibilidades de normas. No dizer de Humberto Ávila: "Normas não são textos nem o conjunto deles, mas os sentidos construídos a partir da interpretação sistemática de textos normativos. Daí se afirmar que os dispositivos se constituem no objeto da interpretação; e as normas, no seu resultado."[94] Quer dizer, pode-se metaforicamente afirmar que um bombom lacrado é o direito em estado inercial. 

Para que a ordem jurídica acompanhe a fluidez da vida social o jurista precisa dinamizar o próprio Direito. Neste desiderato, cabe ao exegeta retirar lentamente o bombom do seu envoltório para que não estrague a forma dele, seja espicaçando a sua cobertura ou introduzindo involuntariamente a segunda camada do chocolate. Após a retirada de todas as camadas, retirar-se-á o produto de todo o manuseio: o sonho de valsa. A mesma operação ocorre no campo jurídico. No caso das regras, é possível extrair a ideia de que a função da regra é realizar a subsunção da hipótese jurídica atraída pela verificação de que o fato da vida ocorreu. O encaixe do fato com a previsão legal é resumido na aplicação da regra. Por exemplo: existe uma regra constitucional que impede que haja uma re-reeleição para certos cargos políticos. 

Assim, aplica-se categoricamente o texto normativo por uma incidência inaudita altera pars. Segundo o insigne Pontes de Miranda: "o que caracteriza a regra jurídica, como lei, é a incidência. O fato, em si-mesmo, não surte eficácia; é preciso que a lei incida sôbre êle, que o faça jurídico: do fato jurídico é que ela dimana."[95] Desta forma, não há espaço, em princípio, para a discussão referente à colisão entre princípios e regras, tendo em vista a hipótese até aqui versada. Destarte, não cabe a um Presidente da República reeleito se candidatar para um terceiro pleito. A candidatura deverá, consequentemente, ser indeferida pela Justiça Eleitoral. 

Diferentemente ocorre quando se trata de discorrer a propósito dos princípios. Até porque, sempre se ressalta o aspecto qualitativo e axiológico neles encontradiço, o que reforça a carnavalização, a euforia principialística e a importação acrítica de um arsenal teórico, independentemente de uma filtragem teórico-metodológica. O doutrinarismo ganhou uma forma proteiforme e uma solidez disforme, sem falar que o que parece vigorar é a mera reprodução daquilo que interessa ou corresponde à pretensão daquele que cita uma tese importada.

Nesta toada, atrofia-se a alma do reprodutor da tese em cima de um punhado de ideias produzidas por um terceiro que mereceria um estudo analítico e agudo. Reconhecendo a tarefa hercúlea em se estabelecer critérios robustos da diagnose diferencial das duas categorias das normas retrocitadas, convoca-se o leitor para o que se entende por regras e princípios jurídicos, salientando o significado plúrimo dos últimos, além de sua aplicação assíntota na órbita teórica brasileira. 

2. Importância da distinção metodológica no cenário transconstitucional    

Após a constatação teórica e prática de que não cabe mais falar em um modelo e, mais ainda, somente em uma realidade constitucional, impende registrar que se avizinha um cenário irremediavelmente transconstitucional. Às vezes de índole única ou de qualidade binária, como um corpo bipartido em qualificações simbióticas, indissociáveis. Separar um corpo com características essenciais de lados tão ontológicos é problematizar, não mitigar o maior problema da contemporaneidade, a saber, a balança da complexidade e da relatividade.

Como o pêndulo das decisões humanas poderá inclinar-se para a esquerda ou direita a depender da preferência pessoal de cada um, quando se trata de princípios e regras a situação não tem sido diferente. É certo que, diante de situações fáticas em si mesmas complexas ou, conforme acentua Ronald Dworkin, nos famosos hard cases[96], não pode o intérprete atuar subsuntivamente[97]. Há outras formas de realizar e efetivar os valores plasmados no sistema jurídico e na Constituição. Com isso, tornar-se essencial diferençar os princípios e regras, ambos os instrumentos a serviços do Direito para a persecução de um fim comum, qual seja, a Justiça.

A doutrina moderna busca gizar uma diferença metodológica entre as normas, porém sem ressaltar o aspecto proteico, multilateral ou poliédrico inerente à capacidade institucional de órgãos judicializados, apenas para exemplificar, do Tribunal Penal Internacional, da Corte Internacional de Justiça, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, da Corte Europeia de Direitos Humanos e da Corte Africana de Direitos Humanos e dos Povos. Alguns sustentam uma cisão estrutural entre ambos, outros procuram evidenciar a distinção entre as normas no que tange à qualidade. Mais ainda, há aqueles que entendem notória a dessemelhança, tendo em vista a teleologia embutida na regra insculpida e no princípio expresso ou implícito.

Antes de se propugnar por uma única e incólume classificação dos princípios e das regras, saliente-se que a intenção é transmitir a polaridade existente em ambos e a contribuição até então para o discurso polimorfo da teoria jurídica brasileira. Sem dúvida esse é um dos maiores dilemas da atualidade. Mesmo assim, é importante e talvez salutar que se intente esboçar, ainda que de modo insuficiente ou precário, a distinção metodológica entre um e outro no horizonte transconstitucional. É o que se tentará fazer. 

2.1. Regras como enunciados prescritivos


A quase insuplantável parte da doutrina e da jurisprudência ratificou o entendimento no sentido de que as regras constituem uma prescrição emanada por um texto jurídico, cujo caráter macroscópico é enunciar um comando definitivo, retilíneo e linear. Os princípios regentes são a segurança jurídica, a garantia da estabilidade do direito positivo e a observância das decisões judiciais, o que reforça a pretensão de se ter um sistema judicial calcado pela previsibilidade. Portanto, o compósito das regras se aproxima com o escopo catártico intuído pelo legislador em se estabelecer balizas determinadas sobre o que se entende por proibido, permitido e obrigatório.

Respeita-se o Legislativo, a produção legiferante e o produto microscópico natural: legislação. No entanto, sabe-se também que é possível rastrear da região nuclear dos princípios as indigitadas regras ou comandos definitivos, o que é intuitivo a partir dos fatos e não meros ornamentos retóricos. Sem redundar, é claro, no brocardo contra factum non argumentum est.

2.2. Princípios como deveres aplicáveis prima facie

Até o presente momento, tem-se como noção magistral acerca dos princípios a do jurista alemão Robert Alexy. Segundo pontua há uma distinção qualitativa entre as regras e os princípios, mas ambos consubstanciam um dever aplicável diante do fato da vida. A única peculiaridade é que os princípios possuem uma carga elástica, uma jurídico-plasticidade que autoriza o intérprete a utilizá-los para preencher zonas ocas. Se a linguagem é o véu do ser e é o que nos forma desde o nascedouro biológico, há de haver uma forma de extirpar controvérsias, dúvidas, ambiguidades dessa mesma linguagem. Agora, que fazer quando ela é aberta, ampla, suscetível a interpretações?

Como cada vida é singular e particular, é perfeitamente plausível que um mesmo princípio seja aplicado para pretensões incompatíveis de per si. O que pode parecer uma contradição é um dado incontornável da facticidade. Hoje, no alvorecer do século XXI, talvez nem mesmo Picard sustentaria piamente a imutabilidade dos princípios, já que nem mesmo as regras deixam de sofrer os contrastes da contínua e permanente evolução dos tempos. O diferencial neste atual estágio é a interdisciplinaridade contributiva do porvir, que significa açambarcar diversas áreas do conhecimento, embrenhar-se em outros setores das ciências sociais e até das ciências da natureza visando uma resposta sistêmica, abrangente de um problema posto à apreciação.[98]

Portanto, ressalte-se que a expressão princípio é bastante fluídica e às vezes não tem o devido refinamento linguístico e jurídico. No caso particular do Direito isso só parece estar mais bem situado no plano interno, porém no âmbito internacional é ainda mais difícil estatuir pilares tão fixos e imperecíveis, especialmente quando se forem observados a infinidade de ordenamentos jurídicos.  O que se deve preservar e laurear é a capacidade de argumentação jurídica, a coerência e a cientificidade, tríade dependente, sem deixar de atestar a perpétua mutação da vida, dos costumes, das regras, dos princípios.[99]

Apesar das dificuldades ínsitas na busca de um conceito suficientemente palatável do que se consideraria um princípio, tal empreitada será mais aprofundada a posteriori.[100] Por isso, diz-se que princípio é toda a norma jurídica que consagra valores e fins a serem realizados. Enquanto o princípio cuida do processo de adequação social (abertura do sistema), tendo em tela a sua amplitude semântico-jurídica, a regra faz parte do processo do fechamento do sistema (rigidez do sistema).[101] A singeleza conceitual é apreensível, porém só é possível captar o significado do termo após verificar o que se entende como valor e fim. 



CONCLUSÃO

Mais uma vez se encerra uma etapa. No caso deste trabalho, tentou-se delinear alguns apontamentos sobre o quadro atual do constitucionalismo, que já não se limita ao vetusto discurso e famigerada constatação histórica, o de que há uma Constituição, notadamente após a epopeia da Assembleia Constituinte de 1987-1988, dotada de supremacia formal e material em relação às outras normas jurídicas, estas de hierarquia inferior. Fortifica-se, assim, o escalonamento kelseniano.

No entanto, no cenário atual vigora uma profusão de decisões tribunalícias, cujo efeito jurídico se protrai no tempo e se espalha no espaço. Se a violação aos direitos fundamentais e humanos é proteica e parece não conhecer escala nas horas, cabe à jurisdição o papel legítimo e disciplinar de repreender condutas à cata da perversidade, desconsideração, elisão. E não é porque a justiça de determinado país não pune condutas internacionalmente reprimíveis que se deve prostrar e deixar o desespero esvair a fagulha da esperança de um futuro melhor.

O papel central é cravar na realidade jurídica mundial a ideia de que as Cortes de Justiça com jurisdição supranacional, cujo intento é preservar e zelar pela integridade dos direitos humanos e dos tratados internacionais, podem também empreender um juízo negativo ou positivo acerca do acerto ou desacerto das decisões dos tribunais nacionais. Não que se sustente o controle das decisões judiciais por um Tribunal Internacional, mas se deve (re)pensar na possibilidade de um controle da convencionalidade mais efetivo, seja potencializando e acelerando o direito à pretensão indenizatória, seja suspendendo o efeito de uma decisão para que se possibilite uma reconsideração. De qualquer maneira, independentemente do acolhimento das sugestões aventadas, espera-se que a semente tenha sido plantada para que os porvindouros estudos tornem-se frutos e alimentem gerações.    
  


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NOTAS



[1] Graduando em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas da UNIME – União Metropolitana de Educação e Cultura.
[2] Este texto foi escrito sob as auspiciosas observações e orientação de Angelo Boreggio, Mestre em Direito pela PUC/SP; Mestre em educação pela UFMT, Especialista em processo tributário pela PUC/SP, em direito tributário, penal e público pela ESUD/MT. Ex-Superintendente do PROCON-MT, atualmente é professor titular UNIME e da FRB - Faculdades Ruy Barbosa - nas cadeiras de Direito do Consumidor e de Direito Tributário. Professor do JUSPODIVM - cursos preparatórios para concurso. Advogado militante. E-mail: angelobneto@ig.com.br
[3] Cf. Marcelo Neves, Transconstitucionalismo, São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 23.
[4] Cf. Marcelo Neves, op. cit., p. 24.
[5] Niklas Luhmann, Soziale Systeme: Grundriß  einer allgemeinen Theorie, 4. Auflage, Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1991 p. 282: “In diesem Sinne ist die Welt multizentrisch - aber so, daß jede Differenz die anderen dem eigenen System oder dessen Umwelt einordnen kann”. 
[6] Hans Kelsen, Reine Rechtslehre, 2. Auflage 1960, p. 1.
[7] Nesta toada, v. Fábio Ulhoa Coelho, Para entender Kelsen, 4ª ed., 2001, p. XV: “Nesta discussão, o pensamento de Kelsen seria marcado pela tentativa de conferir à ciência jurídica um método e objeto próprios, capazes de superar as confusões metodológicas e de dar ao jurista uma autonomia científica. Foi com este propósito que Kelsen propôs o que denominou princípio da pureza, segundo o qual método e objeto da ciência jurídica deveriam ter, como premissa básica, o enfoque normativo. Ou seja, o direito, para o jurista, deveria ser encarado como norma (e não como fato social ou como valor transcendente). Isso valia tanto para o objeto quanto para o método.”
[8] Luís Roberto Barroso, Curso de direito constitucional contemporâneoos conceitos fundamentais e a construção do novo modelo, 2009, p. 240.
[9] V. Fábio Ulhoa Coelho, Para entender Kelsen, 4ª ed., 2001, p. 32: “Na Rússia de outubro de 1917, o cientista do direito deveria afastar a norma hipotética ‘obedeçam o governo provisório de Kerensky, instaurado em março com a derrubada do Czar’, pela norma ‘obedeçam os conselhos populares (soviets)’”.
[10] Neste ponto, cf. Hans Kelsen, Reine Rechtslehre, 2. Auflage 1960, p. 197.
[11] Hans Kelsen, op. cit., p. 200-204.
[12] George Marmelstein, Curso de direitos fundamentais, 2ª ed., 2009, p. XXII: “O direito, em qualquer sentido que se dê à palavra, é impregnado de ideologia. Nele, há disputas políticas, conflito de interesses, valores colidentes em constante tensão. É ingenuidade pensar que a atividade do jurista resume-se a uma mera escolha técnica de qual a norma a ser aplicada ao caso concreto. Vai muito mais além. No âmbito dos direitos fundamentais, essa constatação é ainda mais clara. Imagine temas como o aborto, a eutanásia, as cotas para negros em universidades, o casamento gay etc. Querer discutir temas tão polêmicos de forma “neutra”, isenta de paixão ou sentimento, é ilusão”.  
[13] George Marmelstein, op. cit., p. 5: “Confisco de bens, esterilização, tortura, experimentos médicos com seres humanos, pena de morte, deportação, banimento: tudo isso era praticado de forma regular pelos membros do Terceiro Reich, sob o comando de Hitler, como se fosse algo perfeitamente normal. Essa prática mecanicista de atos de crueldade sem qualquer questionamento acerca de sua maldade intrínseca representa aquilo que a filósofa Hannah Arendt chamou de ‘banalidade do mal’. Havia, no caso, todo um aparato estatal funcionando de forma burocratizada, estruturado para cometer as maiores atrocidades em nome do Estado”.
[14] Foi somente após as condenações empreendidas pelo Tribunal de Nuremberg, que se passou a calcificar a dignidade da pessoa humana como o baldrame axial acima da lei e do próprio Estado. Como salienta George Marmelstein, op. cit, 2009, p. 10: “Com o término da Segunda Guerra Mundial e a queda do regime nazista, os juristas europeus, especialmente os alemães, passaram por uma profunda crise de identidade, típica de qualquer fase de transição. O nazismo foi como um banho de água fria para o positivismo kelseniano, que até então era aceito pelos juristas de maior prestígio”. 
[15] Rudolf von Jhering, Der Kampf um’s Recht, 1894, p. 1: “Das Ziel des Rechts ist der Friede, das Mittel dazu der Kampf”.
[16] Luís Roberto Barroso, op. cit., p. 242: “Sem embargo da resistência filosófica de outros movimentos influentes nas primeiras décadas do século, a decadência do positivismo é emblematicamente associada à derrota do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha. Esses dois movimentos políticos e militares ascenderam ao poder dentro do quadro de legalidade vigente e promoveram a barbárie em nome da lei. Os principais acusados de Nuremberg invocaram o cumprimento da lei e a obediência a ordens emanadas da autoridade competente. Até mesmo a segregação da comunidade judaica, na Alemanha, teve início com as chamadas leis raciais, regularmente editadas e publicadas. Ao fim da Segunda Guerra Mundial, a idéia de um ordenamento jurídico indiferente a valores éticos e da lei como uma estrutura meramente formal, uma embalagem para qualquer produto, já não tinha aceitação no pensamento esclarecido”.
[17] Sobre o ponto, v. infra, tópico II.
[18] Na Constituição alemã, cf. art. 1, 1: “A dignidade da pessoa humana é intocável. Observá-la e protegê-la é dever de todos os poderes estatais”. Texto original: “Die Würde des Menschen ist unantastbar. Sie zu achten und zu schützen ist Verpflichtung aller staatlichen Gewalt”.   
[19] V. John M. Roberts, The Penguin History of the Twentieth Century, 2000, p. 428.
[20] V. John M. Roberts, op. cit., p. 430-431: “It is not just a matter of the scale and intensity of brutality and destructiveness made possible by the capacities of industrial societies. Great atrocities have taken place in the past whose precise extent we can never measure, and the subjective and relative impact of which we cannot imagine, because the mental and cultural context is so hard to understand. Doubtless, too, innumerable acts of appalling cruelty have been lost in oblivion. The most exquisite deliberate tortures, physical and mental, have been inflicted by human beings on one another (and were repeated between 1939 and 1945; many who did not themselves suffer in the evil of the Holocaust died under them).” 
[21] Cf. Marcelo Neves, Transconstitucionalismo, 2009, p. 129: “O que caracteriza o transconstitucionalismo entre ordens jurídicas é, portanto, ser um constitucionalismo relativo a (soluções de) problemas jurídico-constitucionais que se apresentam simultaneamente a diversas ordens. Quando questões de direitos fundamentais ou de direitos humanos submetem-se ao tratamento jurídico concreto, perpassando ordens jurídicas diversas, a ‘conversação’ constitucional é indispensável”.
[22] Marcelo Neves, op. cit., 2009, p. 121: “A questão do transconstitucionalismo não se refere, portanto, à referência inflacionária à existência de uma Constituição em praticamente toda nova ordem jurídica que emerge com pretensão de autonomia. Não interessa primariamente ao conceito de transconstitucionalidade saber em que ordem se encontra uma Constituição, nem mesmo defini-la como um privilégio do Estado. O fundamental é precisar que os problemas constitucionais surgem em diversas ordens jurídicas, exigindo soluções fundadas no entrelaçamento entre elas”.
[23] Cf. J. J. Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da constituição, 7ª ed., 2003, p. 1425 e ss.
[24] Carta das Nações Unidas, art. 78: “O sistema de tutela não será aplicado a territórios que se tenham tornado Membros das Nações Unidas, cujas relações mútuas deverão basear-se no respeito ao princípio da igualdade soberana”.  
[25] Uadi Lammêgo Bulos, Curso de direito constitucional, 6ª ed., 2011, p. 90-91.
[26] Uadi Lammêgo Bulos, op. cit., p. 92-93: “No transconstitucionalismo propriamente dito, ordenamentos distintos se interagem e somam esforços conjuntos para resolverem casos complexos e difíceis. O que predomina é a superação do constitucionalismo provinciano ou paroquial em nome de algo maior: a integração cooperativa, pacífica e desterritorializada de ordens estatais diferentes. Cada Estado continua com a sua soberania e vida própria. Ocorre, apenas, uma integração harmoniosa entre ordens constitucionais de Estados completamente diferentes, algo que está acima de quaisquer simpatias ou antipatias, camaradagens ou disputas pessoais, muito menos institucionais. Para solucionar conflitos envolvendo direitos humanos, duas ou mais Cortes de Justiça, de Estados diferentes, rompem suas barreiras territoriais e abandonam o regionalismo em nome da conversação e do diálogo constitucional”.
[27] Afinal, toda norma ou é uma regra ou um princípio. Neste sentido, v. Robert Alexy, Theorie der Grundrechte, 2 Auflage. Frankfurt am Main, 1994, p. 77: “Jede Norm ist entweder eine Regel oder ein Prinzip”.
[28] Cf. Nelson Nery Jr., Princípios do processo na Constituição Federal, 10ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 325-326: “Os tratados internacionais que versam sobre direitos humanos ingressam no direito interno brasileiro como norma constitucional, desde que aprovados pelo quórum qualificado para as emendas constitucionais (CF 5º §3º). O Pacto de San José da Costa Rica, tratado de direitos humanos que estipula a garantia ao processo com duração razoável (CIDH 8º §1º), ingressou no direito brasileiro interno antes da EC 45/04, que exige o quórum qualificado da CF 5º §3º. É revestido, portanto, do status de norma constitucional, nos termos da regra tempus regit actum, motivo pelo qual esse status constitucional é dado pela CF 5º §2º”.
[29] É o que defende parcela respeitável da doutrina. Apenas a título demonstrativo, cf. Valerio Mazzuoli, Curso de direito internacional público, 5ª ed., 2011, p. 817-847; Valerio Mazzuoli, A tese da Supralegalidade dos Tratados de Direitos Humanos; Luiz Flavio Gomes. Conflito entre a Constituição brasileira e os tratados de direitos humanos. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1.734, 31 mar. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/11100>. Acesso em: 1 mar. 2013; Dirley da Cunha Jr., Curso de direito constitucional, 4ª ed., 2010, p. 634-650; Flávia Piovesan, Direitos humanos e o direito constitucional internacional, 12 ed., 2011, p. 124: “Reitere-se que, por força do art. 5º, §2º, todos os tratados de direitos humanos, independentemente do quorum de sua aprovação, são materialmente constitucionais, compondo o bloco de constitucionalidade”.
[30] Posicionamento esse adotado pelo autor do artigo.
[31] Sobre a expressão no campo consumerista, v. Claudia Lima Marques, Antônio Herman Benjamin e Bruno Miragem, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 3. ed., 2010, p. 30-63.
[32] A sentença foi proferida em 26 de setembro de 2006. Informação obtida em consulta feita na obra de Flávia Piovesan, Direitos humanos e o direito constitucional internacional, 12 ed., 2011, p. 20.
[33] Valerio Mazzuoli, op. cit., p. 818-819.
[34] Paulo Henrique Gonçalves Portela, Direito Internacional Público e Privado: incluindo noções de direitos humanos e de direito comunitário, 4ª ed., 2012, p. 794.
[35] Hans Kelsen, Reine Rechtslehre, 2. Auflage 1960, p. 196.
[36] Hans Kelsen, Reine Rechslehre, 2. Auflage 1960, p. 321.
[37] Neste sentido, v. Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, 3ª ed., 1970, t. I, p. XI: “É fácil compreender-se qual a importância que têm a exatidão e a precisão dos conceitos, a boa escolha e a nitidez dêles, bem como o rigor na concepção e formulação das regras jurídicas e no raciocinar-se com elas. Seja como fôr, há sempre dúvidas, que exsurgem, a respeito de fatos, que se têm, ou não, de meter nas categorias, e da categoria em que, no caso afirmativo, se haveriam de colocar. Outras, ainda, a propósito dos próprios conceitos e das regras jurídicas, que têm de ser entendidas e interpretadas.”
[38] Cf. Rudolf von Jhering, Die passive Wirkung der Rechte, Jahrbücher für die Dogmatik, 1871, p. 387: “A ciência deve ser verdadeiramente prática, mas não se limitar ao prático”.
[39] Afinal, as análises e estudos realizados acerca do novo constitucionalismo demonstram a falta de universalização das conclusões, mormente no que se refere às suas consequências, a origem e os possíveis malefícios inerentes ao fortalecimento do judicial review. Para uma pesquisa atilada dessas implicações na Nova Zelândia, em Israel, no Canadá e na África do Sul, cf. Ran Hirschl, Towards juristocracy: the origins and consequences of the new constitutionalism, 2007, p. 17-30.
[40] Nesse ponto, cf. Marcelo Neves, Tranconstitucionalismo, 2009, p. 286.
[41] Como se sabe, o STF é competente para julgar a ADIn, ADEcon, ADIn por omissão, ADPF e mandado de injunção, além das matérias previstas no art. 102 da CF/88. Por isso, além da inegável conclusão de que há um campo dilargado para o exercício de sua jurisdição e do seu múnus constitucional, imperioso sustentar ainda a multiplicidade de matérias espraiadas no Texto Constitucional que, para a remansosa doutrina, caracteriza-se como analítico ou prolixo. 
[42] Cogência, obrigatoriedade ou imperatividade.
[43] Sobre as particularidades do referido Caso Araguaia, cf. Ana Luisa Zago de Moraes, O “Caso Araguaia” na Corte Interamericana de Direitos Humanos, Revista Liberdades, n. 8, 2011, p. 89: “A importância da condenação é enorme, uma vez que corresponde à expectativa de diversos movimentos sociais brasileiros e internacionais, além do próprio Ministério da Justiça e da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, que visam à promoção da verdade e da memória como direito humano, que não pode ser tolhido por medidas estatais que omitem fatos históricos como assassinatos e desaparecimentos forçados durante a Ditadura Militar brasileira”.
[44] Dirley da Cunha Jr., op. cit., p. 637-645: “A essa abertura material podemos denominar, com apoio em Jorge Miranda, de não tipicidade dos direitos fundamentais. Em face dela, entendemos que a Constituição brasileira reconhece a fundamentalidade material dos direitos fundamentais, na medida em que se associou a um conceito materialmente aberto de direitos fundamentais. Desse modo, são encontradiços na nossa Constituição não só os direitos formal e materialmente fundamentais (a maioria dos direitos fundamentais previstos no catálogo), mas também os direitos só formalmente fundamentais (de que são exemplos os contidos no art. 5º, incisos XXVIII e XXIX e art. 7º, incisos XI e XXIX) e tão-só materialmente fundamentais (estes situados fora do catálogo da Constituição ou até mesmo fora da própria Constituição, como se verá, identificados pelo conteúdo comum baseado no princípio da dignidade da pessoa humana)”. E conclui: “Esses direitos materialmente fundamentais, como já sublinhado acima, identificam-se por seu conteúdo comum baseado no princípio da dignidade da pessoa humana. Com base neste princípio fundamental, reconhecem-se os direitos materialmente fundamentais, sejam implícitos, decorrentes ou previstos em tratados internacionais. A dizer, a abertura material a novos direitos fundamentais implica que estes devam ser reconduzidos de forma direta e corresponder ao valor da dignidade da pessoa humana”.
[45] Bodo Pieroth e Bernard Schlink, Grundrechte – Staatsrecht II, 27. Auflage, 2011, p. 27.
[46] Para uma preciosa análise do caso e das possíveis soluções para casos futuros (compensatórias, processuais e sancionatórias), cf. Aury Lopes Jr., Direito processual penal, 10. ed., 2013, p. 209-219.
[47] Conforme aduz Valerio Mazzuoli, Curso de direito internacional público, 5. ed., 2011, p. 890: “A Corte detém uma competência consultiva (relativa à interpretação das disposições da Convenção, bem como das disposições de tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados Americanos) e uma competência contenciosa, de caráter jurisdicional, própria para o julgamento de casos concretos, quando se alega que algum dos Estados-partes na Convenção Americana violou algum de seus preceitos. Contudo, a competência contenciosa da Corte Interamericana é limitada aos Estados-partes da Convenção que reconheçam expressamente a sua jurisdição. Isto significa que um Estado-parte na Convenção americana não pode ser demandado perante a Corte se ele próprio não aceitar a sua competência contenciosa. Ocorre que, ao ratificarem a Convenção Americana, os Estados-partes já aceitam automaticamente a competência consultiva da Corte, mas em relação à competência contenciosa, esta é facultativa e poderá ser aceita posteriormente. Este foi o meio que a Convenção Americana encontrou para fazer com que os Estados ratificassem a Convenção sem receio de serem prontamente demandados. Tratou-se de uma estratégia de política internacional que acabou dando certo, tendo o Brasil aderido à competência contenciosa da Corte em 1998, por meio do Decreto Legislativo nº. 89, de 3 de dezembro desse mesmo ano, segundo o qual somente poderão ser submetidas à Corte as denúncias de violações de direitos humanos ocorridas a partir do seu reconhecimento (perceba-se, aqui, a cláusula temporal de aceite do Brasil à competência contenciosa da Corte Interamericana: somente se poderá demandar o Brasil perante a Corte a partir desse reconhecimento”.
[48] Sobre a natureza e conteúdo mínimo da dignidade humana, cf. Luis Roberto Barroso, A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: Natureza Jurídica, Conteúdos Mínimos e Critérios de Aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dezembro de 2010.
[49] Neste sentido, v. Nelson Nery, op. cit., p. 326: “Contudo, isso não exime o Estado brasileiro de responder por violação a direitos humanos – e a duração exagerada do processo é uma dessas violações, por descumprimento da CIDH 8º §1º -, por duas razões: a) trata-se de norma prevista em tratado internacional com vigência no Brasil (CF 5º §§2º e 3º); b) trata-se de princípio constitucional expresso na CF 5º LXXVIII”. Com esteio no pensamento do internacionalista Augusto Cançado Trindade a favor da internacionalização dos direitos do homem, inclusive considerando o direito de petição e a intangibilidade da jurisdição verdadeiras cláusulas pétreas de proteção internacional dos direitos do homem, cf. Iracema Fazio, O alcance da jurisdição da Corte Interamericana de Direitos do Homem, Revista Jurídica da Faculdade de Ciências Jurídicas da Unime, v. 2, 2012, p. 31: “são estas cláusulas que tornam viável o acesso dos indivíduos à justiça internacional. Ademais, some-se à elas o dever de fiel cumprimento, por parte dos Estados Partes nos tratados de direitos do homem, das decisões daqueles tribunais, assim como o exercício da garantia coletiva pelos Estados Partes”.
[50] Entendendo o princípio da culpabilidade como um meio de limitação à violação (Das Schuldprinzip als Mittel der Eingriffsbegrenzung), cf. Claus Roxin, Strafrecht. Allgemeiner Teil. 4 Auflage., 2006, p. 91-95. 
[51] Em sentido favorável à tese aqui defendida, cf. cf. Ana Luisa Zago de Moraes, O “Caso Araguaia” na Corte Interamericana de Direitos Humanos, Revista Liberdades, n. 8, 2011, p. 90: “Filiamo-nos ao entendimento de que deve prevalecer a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, uma vez que a posição estatalista, vinculada à ‘Supremocracia brasileira’, vai de encontro à nova ordem constitucional brasileira, humanista e democrática, bem como ao teor das obrigações internacionais paulatinamente assumidas pelo Brasil, graças a numerosas convenções relativas aos Direitos Humanos firmadas e incorporadas à ordem jurídica pátria, além das normas de jus cogens. Dentre as Convenções que corroboram a posição da Corte, estão a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a Convenção para Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio e a Convenção Americana de Direitos Humanos, e, dentre as normas de jus cogens, encontra-se o imperativo de os Estados reprimirem os crimes contra a humanidade, dentre eles os desaparecimentos forçados e a tortura”. 
[52] Flávia Piovesan, op. cit., p. 158: “Logo, na hipótese de eventual conflito entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito interno, adota-se o critério da prevalência da norma mais favorável à vítima. Em outras palavras, a primazia é da norma que melhor proteja, em cada caso, os direitos da pessoa humana. A respeito, elucidativo é o art. 29 da Convenção Americana de Direitos Humanos, que, ao estabelecer regras interpretativas, determina que “nenhuma disposição da Convenção pode ser interpretada no sentido de limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos em virtude de leis de qualquer dos Estados-partes ou em virtude de Convenções em que seja parte um dos referidos Estados”. Consagra-se, assim, o princípio da normas mais favorável, seja ela do Direito Internacional, seja do Direito interno. A escolha da norma mais benéfica ao indivíduo é tarefa que caberá fundamentalmente aos Tribunais nacionais e a outros órgãos aplicadores do Direito, no sentido de assegurar a melhor proteção possível ao ser humano” (grifos nossos). 
[53] Tal expressão foi proferida em uma palestra em 1862, por Ferdinand Lassalle, Über Verfassungswesen. Conteúdo disponível em: http://www.gewaltenteilung.de/lassalle.htm.
[54] Pontes de Miranda, op. cit., p. 6: “Para que os fatos sejam jurídicos, é preciso que regras jurídicas – isto é, normas abstratas – incidam sôbre eles, desçam e encontrem os fatos, colorindo-os, fazendo-os ‘jurídicos’. Algo como a prancha da máquina de impressão, incidindo sôbre fatos que se passam no mundo, pôsto que aí os classifique segundo discriminações conceptuais”. E continua: “a regra jurídica há de ser igual para todos os fatos da mesma classe (isonômica). À lei é essencial colorir fatos, tornando-os fatos do mundo jurídico e determinando-lhes os efeitos (eficácia deles). Se a lei trata por igual fatos da mesma classe, a eficácia dêsses fatos será a mesma, se considerarmos qualquer dêles”.
[55] Luis Roberto Barroso, Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil, p. 26: “A partir de 1988, e mais notadamente nos últimos cinco ou dez anos, a Constituição passou a desfrutar já não apenas da supremacia formal que sempre teve, mas também de uma supremacia material, axiológica, potencializada pela abertura do sistema jurídico e pela normatividade de seus princípios. Com grande ímpeto, exibindo força normativa sem precedente, a Constituição ingressou na paisagem jurídica do país e no discurso dos operadores jurídicos”.
[56] Sobre a integridade do direito, v. Ronald Dworkin, O império do direito, 2010, p. 213-331.
[57] Tal reflexão foi fruto de uma profícua conversa travada com o filósofo e Professor Carlos Costa.
[58] Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, 1978, t. XVII, p. 321: “Toda obra de ciência – e de direção dos povos – exige dedicação e amor. Sem isso, não se constrói. Para que alguma tradição cultural se forme, ou se mantenha, é preciso que haja espíritos capazes de sacrifício e de convicções, que dêem o máximo de si mesmos à sua obra”.
[59] Para uma ferrenha crítica a propósito da discricionariedade dos juízes, cf. Lenio Streck, O que é isto – decido conforme minha consciência?, 2010, p. 47: “Se fizermos uma análise do problema ‘de como decidir’ à luz da filosofia da linguagem, ficará evidente que as teorias que apostam na vontade do intérprete (e esse é, efetivamente, ‘o problema’ do ‘livre convencimento’) acabam gerando/possibilitando discricionariedades e arbitrariedades. (...) Por sua vez, no direito constitucional, essa perspectiva é perceptível pela utilização descriteriosa dos princípios, transformados em ‘álibis persuasivos’, fortalecendo-se, uma vez mais, o protagonismo judicial (nas suas diversas roupagens, como o decisionismo, o ativismo, etc). O uso da ponderação é também nesse ramo do direito outro sintoma de uma espécie de ‘constitucionalismo da efetividade’, pelo qual o mesmo ‘princípio’ é utilizado para sustentação de teses antitéticas”. 
[60] Virgílio Afonso da Silva, Interpretação constitucional e sincretismo metodológico. In: Virgílio Afonso da Silva (org.), Interpretação constitucional, 2005, p. 135-136.
[61] A propósito da terminologia, cf. Leonardo Athayde Luna, Direito e Interpretação: uma busca interdisciplinar, artigo publicado na Revista Jurídica da Faculdade de Ciências Jurídicas da Unime. Disponível em: http://revistafcjunime.blogspot.com.br/.
[62] Sobre a expressão, v. texto mimeografado por Leonardo Athayde Luna, Judicialização, ativismo judicial e a preservação da democracia: uma convivência possível diante de paralaxes interpretativas.
[63] Há farta produção doutrinária acerca da expressão e das implicações referentes (a) à sua defesa; (b) opróbrio e (c) até, no âmbito da discricionariedade judicial, ao estabelecimento de limites procedimentais, éticos e de conteúdo. Neste trilhar polifacetado, cf. Luiz Guilherme Marinoni, Teoria geral do processo, 6ª ed., 2012, p. 40-46; Fredie Didier Jr., Curso de direito processual civil, vol. 1, 11 ed., 2009, p. 25: “Vive-se, atualmente, uma fase de renovação do estudo do Direito Constitucional. Há diversas manifestações disso: a) parte-se da premissa de que a Constituição tem força normativa e, por consequência, também têm força normativa os princípios e os enunciados relacionados aos direitos fundamentais; b) pela expansão da jurisdição constitucional (controle de constitucionalidade difuso e concentrado, como é o caso do Brasil); c) desenvolvimento de uma nova hermenêutica constitucional (com a valorização dos princípios e o desenvolvimento dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade). A essa fase deu-se o nome de Neoconstitucionalismo ou pós-positivismo.” 
[64] Países como a Alemanha e Itália serviram de norte paradigmático para o estudo do novo constitucionalismo, sobretudo com a criação das Cortes Constitucionais e a promulgação de Constituições que romperam com um passado nada democrático. Nesse trilhar, costuma-se ressaltar o marco histórico inerente ao constitucionalismo do pós-guerra nos retro mencionados países, sobretudo no que tange à Lei Fundamental de Bonn (1949), o que fez com que se criasse o Tribunal Constitucional Federal, em 1951. Na Itália, um pouco antes: “l’Assemblea costituente si accinse ad elaborarei l texto della Costtituzione della Repubblica italiana (approvato poi il 22 dicembre 1947, promulgato dal Capo dello Stato il 27 dicembre ed entrato in vigore il 1º gennaio 1948)”. Vê-se que a Constituição da Itália foi aprovada em 1947, o que fez com que se tornasse iminente a instalação da Corte Costituzionale, em 1956, instalação prevista no art. 134, in verbis: La Corte costituzionale giudica: sulle controversie relative ala legittimità costituzionale delle leggi atti, aventi forza di legge, dello Stato e delle Regioni; sui conflitti di attibuzione tra i poteri dello Stato e su quelli tra lo Stato e le Regioni, e tra le Regioni; sulle acuse promosse contro il Presidente della Repubblica, a norma della Costituzione”. Informações obtidas no sítio http://www.cortecostituzionale.it, visitado em 18 de janeiro de 2013.
[65] O termo neopositivismo é bastante amplo, máxime por possuir semântica referente ao próprio desenvolvimento da Filosofia Analítica, ao Positivismo Lógico ou ao que se convencionou chamar de Empirismo Lógico. A linguagem passou a ser estudada pela Semiótica, que abarca todos os mínimos esquemas de comunicação. Com isso, praticamente todas as classes científicas se enredaram por estudar, em clima intelectualmente cooperativo e contributivo, os limites das aporias, dubiedades e epiquiremas dos textos a serem lidos. No campo das Ciências Jurídicas isso é muito emblemático, principalmente no campo interpretativo. Percebe-se, portanto, a importância da associação e interdisciplinaridade. Nesta esteira, cf. Gisele Leite, Neopositivismo, neoconstitucionalismo e o neoprocessualismo: o que há realmente de novo no direito?, Revista Eletrônica Temas Atuais de Processo Civil, vol. 2, n. 5, 2012; Uadi Lammêgo Bulos, op. cit., 73: “Em nossa opinião, o grande contributo do Neopositivismo para o Direito Constitucional foi deixar a mensagem de que não há linguagem quimicamente pura, em qualquer dos planos por onde percorra (sintático, semântico ou pragmático). Daí as imprecisões, ambiguidades e contradições nos artigos, incisos e alíneas das constituições, muitas vezes dissociados de uma visão rigorosa e sistemática do mundo”.  Apesar dessas preambulares conclusões, consequentes dos limites textuais do presente artigo, é preciso separar o joio do trigo, para que não fiquemos reféns de um pavoroso rodeio de absurdidades com carga meramente retórica, mas vazia de conteúdo científico. Emprestar ao neopositivismo um significado parelho ou anexo ao neoconstitucionalismo depende primeiro da interiorização da camada filosófica incrustada no famigerado Círculo de Viena. Neste sentido, cf. Miguel Reale, Filosofia do direito, 19 ed., 2000, p. 9: “Ora, a Filosofia do Direito, esclareça-se desde logo, não é disciplina jurídica, mas é a própria Filosofia enquanto voltada para uma ordem de realidade, que é a ‘realidade jurídica’. Nem mesmo se pode afirmar que seja Filosofia especial, porque é a Filosofia, na sua totalidade, na medida em que se preocupa com algo que possui valor universal, a experiência histórica e social do direito. O direito é realidade universal. Onde quer que existe o homem, ai existe o direito como expressão de vida e de convivência. É exatamente por ser o direito fenômeno universal que é ele suscetível de indagação filosófica.” Por estas e outras razões é que, consoante Miguel Reale, op. cit., p. 7: “a Filosofia  representa um perene esforço de sondagem nas raízes dos problemas. É uma ciência cujos cultores somente se considerariam satisfeitos se lhes fosse facultado atingir, com certeza e universalidade, todos os princípios ou razões últimas explicativas da realidade, em uma plena interpretação da experiência humana”. Mais ainda, é preciso investigar a fundo o próprio positivismo enquanto rudimento filosófico, tendo uma relação umbilical com as obras de Immanuel Kant e Augusto Comte. Conforme aponta Miguel Reale, Introdução à filosofia, 4ª ed., 2002, p. 140: “O relativismo positivista baseia-se na apreciação do saber como saber positivo de ‘relações’, que marcaria a terceira fase evolutiva da Humanidade, superando os chamados estados ‘teológicos’ e ‘metafísico’. Há certa coincidência entre o kantismo e o comtismo, porque ambos excluem o absoluto da possibilidade do conhecimento, contrapondo-se à Metafísica tradicional. Ressalta, porém, a diferença essencial na natureza das respostas, porque partem os dois pensadores de pressupostos diversos, podendo-se dizer que Comte, infenso a qualquer subjetividade a priori, estabelece uma correlação progressiva entre o processar-se dos fenômenos e o pensamento que no real encontra a fonte de seu desenvolvimento. O mestre do positivismo não apresenta, com efeito, qualquer a priori em sua concepção relativismo do mundo, no qual as formas distintas do saber se compõem em um ‘organismo unitário do conhecimento’, do qual se deduzem as diretrizes ordenatórias da vida prática, ou da Política”.
[66] Norberto Bobbio, O Positivismo Jurídico: Lições de filosofia do direito, São Paulo: Ícone, 1995, p. 229-232.
[67] Pablo Martín Perot, Inconstitucionalidad, legalidad y orden jurídico. Discusiones,  Bahía Blanca,  n. 2,   2001. Disponível em <http://bibliotecadigital.uns.edu.ar/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1515-73262001000100007&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em  11  jan.  2013.
[68] Cf. SARMENTO, Daniel. Neoconstitucionalismo no Brasil: riscos e possibilidades. In: Por um constitucionalismo inclusivo: história constitucional brasileira. Teoria da Constituição e Direitos Fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 233-272.
[69] Luís Roberto Barroso, Constituição, democracia e supremacia judicial: direito e política no Brasil contemporâneo, p. 10: “a ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. Em muitas situações, sequer há confronto, mas mera ocupação de espaços”.
[70] Luis Roberto Barroso, Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo, 2009, p. 5: “Constitucionalismo significa, em essência, limitação do poder e supremacia da lei (Estado de direito, rule of the lawRechtsstaat).”
[71] Conforme destacamos em um texto mimeografado, cf. Leonardo Athayde Luna, Judicialização, ativismo judicial e a preservação da democracia: uma convivência possível diante de paralaxes interpretativas, p. 20-21: “A judicialização tornou-se a ordem do dia, mormente em países que passaram por momentos de violência institucional ou paralisação do relógio democrático. (...) Mas, há um conjunto de fatores que propiciaram este fenômeno, tais como a reconstrução da ciência jurídica, muito influenciada a partir da constitucionalização e o surgimento de uma nova postura de pensar o Direito, que não está mais afunilado em determinado campo ou em uma partícula estanque do conhecimento. Agora, ele passa a enveredar-se para um viés gnosiológico globalizante, importando-se, pois, com as relações entre a Filosofia, a Ética, a História, o Direito Comparado, a Política. Passou-se a exigir daqueles que manuseiam o instrumental jurídico o chamado estrabismo interpretativo, uma maneira elástica de observar a experiência jurídica.”
[72] Para uma percuciente crítica a propósito das diversas posições adotadas pela judicatura de um modo geral, cf. Cass Sunstein, Radical in robes: why extreme right-wing courts are wrong for america, 2005.
[73] Luis Roberto Barroso, op. cit., p. 266: “Foram afetadas premissas teóricas, filosóficas e ideológicas da interpretação tradicional, inclusive e notadamente quanto ao papel da norma, suas possibilidades e limites, e ao papel do intérprete, sua função e suas circunstâncias. Nesse ambiente, ao lado dos elementos tradicionais de interpretação jurídica e dos princípios específicos de interpretação constitucional delineados ao longo do tempo, foram descobertas novas perspectivas e desenvolvidas novas teorias. Nesse universo em movimento e em expansão, incluem-se categorias que foram criadas ou reelaboradas, como os modos de atribuição de sentido às cláusulas gerais, o reconhecimento de normatividade aos princípios, a percepção da ocorrência de colisões de normas constitucionais e de direitos fundamentais, a necessidade de utilização da ponderação como técnica de decisão e a reabilitação da razão prática como fundamento de legitimação das decisões judiciais.”
[74] Para uma visão geral sobre a temática, v. Luís Roberto Barroso, Neoconstitucionalismo e constitucionalização (O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil). 
[75] Konrad Hesse, Grundzüge des Verfassungsrecht der Bundesrepublik Deutschland, 20. Auflage, 1999, p. 10: “Die Verfassung ist die rechtliche Grundordnung des Gemeinwesens”.
[76] Konrad Hesse, A força normativa da Constituição, 1991.
[77] Para uma análise histórica e elucidativa das diversas formas de se interpretar, cf. Carlos Maximiliano, Hermenêutica e aplicação do direito, 18 ed., 1999, p. 44-50.
[78] Cf. Robert Alexy, op. cit., p. 72 e ss. Na literatura brasileira, v. Virgílio Afonso da Silva, Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia, 2ª ed., 2011, p. 45: “O principal traço distintivo entre regras e princípios, segundo a teoria dos princípios, é a estrutura dos direitos que essas normas garantem. No caso das regras, garantem-se direitos (ou se impõem deveres) definitivos, ao passo que no caso dos princípios são garantidos direitos (ou são impostos deveres) prima facie”.  
[79] Robert Alexy, op. cit., p. 76-77.
[80] Para uma científica crítica ao paradigma ponderativo, cf. Humberto Ávila, Neoconstitucionalismo: entre a ciência do direito e o direito da ciência. Revista Eletrônica de Direito do Estado (REDE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 17, janeiro/fevereiro/março, 2009, p. 9-10: “o paradigma da ponderação conduz a um subjetivismo e, com isso, à eliminação ou severa redução do caráter heterolimitador do Direito. Uma norma jurídica (ou mandamento) diferencia-se de um conselho por dever ser considerada e por dever servir de orientação para a conduta a ser adotada. Um conselho é aquilo que não precisa ser levado em consideração, mas mesmo que o seja, não necessariamente precisa orientar a conduta a ser adotada. Além de dever servir de critério orientador da conduta, um mandamento caracteriza-se por se externo e autônomo relativamente ao seu destinatário: o mandamento só exerce sua função de guia de conduta se for independente do seu destinatário. E para ser independente do seu destinatário, ele precisa ser por ele minimamente reconhecível antes da conduta ser adotada.” Mais à frente: “Se quem faz é o próprio destinatário, ele mesmo termina por guia a sua conduta, o que conduz à eliminação do caráter heterolimitador do Direito. O próprio destinatário da norma, que deveria agir seguindo sua prescrição, termina por definir o seu conteúdo, decidindo, ele próprio, o que deve fazer. Se quem faz a ponderação é o Poder Judiciário, sem critérios antecipados e objetivos para sua execução, aquilo que o destinatário deveria saber antes ele só ficará sabendo depois, o que leva à supressão do caráter orientador do Direito e da função legislativa. O aplicador da norma, que deveria reconstruir um sentido normativo anterior e exterior, acaba por construí-lo, decidindo, ele próprio, o que a Constituição atribuiu ao Poder Legislativo definir”.
[81] Cf. Robert Alexy, op. cit., p. 100. 
[82] Luis Roberto Barroso, Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo, 2009, p. 382-383: “A constitucionalização, na linha do argumento aqui desenvolvido, expressa a irradiação dos valores constitucionais pelo sistema jurídico. Essa difusão da Lei Maior pelo ordenamento se dá por via da jurisdição constitucional, que abrange a aplicação direta da Constituição a determinadas questões; a declaração de inconstitucionalidade de normas com ela incompatíveis; e a interpretação conforme a Constituição, para atribuição de sentido às normas jurídicas em geral. (...) Ao lado desse exercício amplo de jurisdição constitucional, há um outro fenômeno que merece ser destacado. Sob a Constituição de 1988, aumentou de maneira significativa a demanda por justiça na sociedade brasileira. Em primeiro lugar, pela redescoberta da cidadania e pela conscientização das pessoas em relação aos próprios direitos. Em seguida, pela circunstância de haver o texto constitucional criado novos direitos, introduzido novas ações e ampliado a legitimação ativa para tutela de interesses, mediante representação ou substituição processual. (...) Pois bem: em razão desse conjunto de fatores – constitucionalização, aumento da demanda por justiça e ascensão institucional do Judiciário -, verificou-se no Brasil uma expressiva judicialização de questões políticas e sociais, que passaram a ter nos tribunais a sua instância decisória final”.
[83] Sobre a expressão e as suas implicações no mundo prático, cf. Leonardo Athayde Luna, A precedentalização do sistema romano-germânico brasileiro: da supremacia da lei para a importância do judge make law.
[84] Cf. Luiz Guilherme Marinoni, Teoria geral do processo, 6ª ed., 2012, p. 43: “Recorde-se que o princípio da legalidade, no Estado legislativo, implicou na redução do direito à lei, cuja legitimidade dependia apenas da autoridade que a emanava. Atualmente, como se reconhece que a lei é o resultado da coalizão das forças dos vários grupos sociais, e que por isso frequentemente adquire contornos não só nebulosos, mas também egoísticos, torna-se evidente a necessidade de submeter a produção normativa a um controle que tome em consideração os princípios de justiça”.
[85] A remissão à decisão quantitativa é eloquente, justamente na pós-modernidade que parece primar pela celeridade processual e na aparente produtividade do Poder Judiciário. Quanto mais decisões proferidas, independentemente da qualidade, melhor.
[86] Cf. Luiz Guilherme Marinoni, op. cit., p. 22: “A transformação da concepção de direito fez surgir um positivismo crítico, que passou a desenvolver teorias destinadas a dar ao juiz a real possibilidade de afirmar o conteúdo da lei comprometido com a Constituição. Nessa linha podem ser mencionadas as teorias dos direitos fundamentais, inclusive a teoria dos princípios, a técnica da interpretação de acordo, as novas técnicas de controle da constitucionalidade – que conferem ao juiz uma função “produtiva”, e não mais apenas de declaração de inconstitucionalidade – e a própria possibilidade de controle da inconstitucionalidade por omissão no caso concreto.”
[87] Segundo o raciocínio alexyano, é possível distinguir três dimensões da dogmática jurídica: uma analítica, uma empírica e uma normativa. Para uma prospecção acerca da tríade dimensão, cf. Robert Alexy, Theorie der Grundrechte, 1994, p. 22-27.
[88] Jorge Bacelar Gouveia, Manual de direito internacional público, 2005, p. 294-295.
[89] Jorge Bacelar Gouveia, op. cit., p. 295: “O monismo, que conta hoje com um maior número de adeptos, frisa, pelo contrário, os diversos aspectos que têm feito aproximar as naturezas do Direito Internacional e do Direito Estadual, exatamente naqueles mesmos argumentos: – na proximidade nas fontes: se é verdade que os tratados internacionais, enquanto tal, não têm paralelo no Direito Estadual, não é menos verdade que, ao nível interno, há já sinais de intensa ‘contratualização legislativa’, para além do facto de no Direito Internacional serem relevantes outras fontes, como o costume, que é estruturalmente idêntico ao costume interno, que também se considera aplicável; – na coincidência de sujeitos: não pondo em causa o maior pendor institucional do Direito Internacional, não se pode também dizer que outros sujeitos, como a pessoa humana, não sejam directos destinatários das suas normas, sendo ainda de considerar que o Estado, ao nível interno, é também destinatário dos actos jurídico-públicos que ele próprio dimana; – na diversificação dos mecanismos de garantia: o ponto de partida quanto à perfeição do aparelho estadual de coerção nem sempre é verdadeiro, com o recurso cada vez mais frequente às soluções arbitrais, ao mesmo tempo que, no plano internacional, se tem privilegiado a consolidação das estruturas jurisdicionais, de que o recente TPI vem a ser um exemplo”.
[90] Neste sentido, cf. Flávia Piovesan, Direitos humanos e o direito constitucional internacional, 12 ed., 2011, p. 144-145.
[91] Nelson Nery Jr., op. cit., 10 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 35: Talvez o pecado mais sério da doutrina hodierna seja o de tratar o tema mediante sincretismo, vale dizer, misturando-se as teorias que se utilizam de critérios e parâmetros distintos uns dos outros".
[92] Luís Roberto Barroso, Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção de um novo modelo, 2009, p. 207.
[93] Cf. Robert Alexy, Theorie der Grundrechte, 1994, p. 100.
[94] Humberto Ávila, Teoria dos princípios, 2009, p. 30.
[95] Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, 3 ed., 1970, t. I, p. 22.
[96] Cf. Ronald Dworkin, Taking rights seriously, 1978, p. 81-130.
[97] O analista do direito pode até fazer isso, mas nem sempre conseguirá obter uma interpretação condizente com o que se entende por equitativo ou conforme a Constituição (Verfassungskonforme Auslegung). A lógica impõe que para casos complexos as soluções não podem ser simples. Sobre a terminologia alemã, v. Konrad Hesse, op. cit., p. 30-31.  
[98] Neste ponto, observou Pontes de Miranda, À margem do direito: ensaio de psychologia jurídica, 1912, p. 146-147: “Edmond Picard allude a umas verdades supremas e immutaveis do Direito, especie de dogmas, a que dá apenas a roupagem mo-derna de « princípios », quando cm ver-dade não há regras fixas e immutaveis em direito, se não processos logicos de appli-cal-o e de adquiril-o, esses mesmos colhidos por uma contorsão, por um excesso c ousadia intellectual que em tudo vê ele-mentos capazes de posição logica em nosso espirito. O que ha de immutavel no direito é a unidade de experiencia social, a pedra basilar sobre que se assediam todas as for-mações socíaes meramente jurídicas, o fundo commum e psychologico da moral e da sa-bença jurídica dos homens”.
[99] Pontes de Miranda, op. cit., p. 147: “No tempo não há senão a variabilidade das leis, como só existe a mutabilidade dos costumes, das usanças e das formações proloquiaes, que se colorem e se embotam mais tarde, que se desvanecem e se succedem, por mercê da mutação perpetua, que é condição da vida”.  
[100] Para um estudo crítico e amplo sobre a matéria, sugere-se texto da lavra de Humberto Ávila, A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista Diálogo Jurídico, nº 4, 2001.
[101] Marcelo Neves, op. cit., p. 63: “Do lado do direito, cabe definir a sua racionalidade específica como ‘justiça’. Essa implica, em relação ao sistema jurídico, a ‘consistência jurídica’ no plano da autorreferência (fechamento normativo) e a ‘adequação’ ou ‘adequada complexidade’ à sociedade (abertura cognitiva), especialmente dos processos de decisão de casos jurídicos, sendo caracterizada como uma ‘fórmula de contingência’ porque motiva a ação e a comunicação no âmbito jurídico”.

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